Bloco de Governo
Parece que a XI Convenção do Bloco de Esquerda (BE) foi percorrida por um frémito: o de que o partido se aproxima do Governo. Francisco Louçã citou o grande Buzz Lightyear, apontando para “o infinito e mais além”, Mariana Mortágua avisou o mundo de que ela e os “camaradas” estavam “prontos” para isso e Pedro Filipe Soares invocou “o sonho de governar o nosso país”. Se fossemos aplicar o estilo de discussão típico do BE, talvez devêssemos gritar aos quatro ventos: cuidado, vêm aí os comunistas! Vendo bem, o BE é um agregado de partidos que arrasta o lastro histórico de algumas das mais horrorosas experiências totalitárias de sempre.
Mas não vale a pena adoptar o mesmo estilo amedrontador, que é bastante desagradável, até porque o que se está passar é outro clássico político da esquerda: o da cooptação para a forma democrática da esquerda radical pela esquerda moderada. O grande papel histórico do Partido Socialista (e partidos do seu género) tem sido o de converter irredutíveis esquerdistas em bons democratas: de Mário Soares aos últimos dissidentes comunistas, passando por Ferro Rodrigues ou Jorge Sampaio, gerações e gerações de radicais passaram pela máquina processadora da esquerda moderada. Bem pode o BE gritar contra o PS, que a gente percebe tratar-se de uma rábula. Na verdade, o BE anseia por normalidade, com muita gente do PS a servir de sherpa.
Resta saber se a linha oficial agora adoptada passa pelo crivo dos eleitores. Na Convenção, muitos militantes desalinhados expressaram horror pela deriva “pequenoburguesa” da actual direcção. Só as eleições dirão se serão estes os que estão em maior número, levando a um êxodo de eleitores tradicionais do BE, que colocarão a pergunta fatal: se é para sermos iguais ao PS, porque não votar no original? Os dados foram lançados; agora, é ver qual o resultado quando pararem de rodar.
BEM PODE O BE GRITAR CONTRA O PS, QUE A GENTE PERCEBE TRATAR-SE DE UMA RÁBULA