Continuidade
Aproposta de Orçamento do Estado para 2020 é, de facto, de “continuidade”, como disse António Costa, sobretudo de continuidade na austeridade disfarçada, que foi o que definiu os tempos da geringonça. Nessa altura, para “devolver” salários e pensões, a austeridade afectou o investimento, a Saúde, a Educação e os transportes. Agora, para aumentar os gastos em Saúde, investimento e transportes, a austeridade vai afectar aqueles a quem foram “devolvidos” os rendimentos: é o que significa o aumento dos salários da Função Pública muito abaixo da taxa de inflação. Sim, há carreiras que vão ser descongeladas, mas como isso também custa bastante, é outra razão para não aumentar os salários.
Acresce que os novos gastos têm muito que se lhe diga: mais ou menos dois terços do aumento na Saúde vão ser consumidos a pagar dívidas de suborçamentações passadas, e o outro terço não vai ser, na realidade, gasto em 2020, mas ao longo de vários anos. Os aumentos no investimento e nos transportes também são plurianuais e, mesmo assim, só agora voltam aos níveis do tempo de Passos Coelho. Se somarmos um aumento na Educação também abaixo da taxa de inflação, temos a medida do amor do Governo pelo Estado Social.
Depois, há os vários impostos indirectos e taxas e taxinhas: sobre o tabaco, sobre os carros, sobre o gasóleo, sobre o crédito. Adicionando-se a isto o truque do aumento dos escalões do IRS também abaixo da taxa de inflação, que a todos reduzirá o rendimento disponível. Faltando saber qual o uso que Mário Centeno fará da sua técnica favorita para mostrar pequenos défices ou excedentes: as cativações. Afinal, a austeridade, mais ou menos suavizada, nunca nos abandonou. E só há uma forma de sairmos deste círculo deprimente: mais crescimento económico. Mas o Orçamento não contribui em nada para isso e, na verdade, até o dificulta.