Parecer, parece
OOrçamento Suplementar aprovado na generalidade ontem no parlamento, para dar cabimento às medidas de resposta à crise económica e social provocada pela pandemia, chegou aos deputados acompanhado de um inusitado e inconcebível parecer jurídico que basicamente tentava barrar aos partidos a possibilidade de apresentarem quaisquer propostas de alteração ao documento do Governo. A justificação para tamanha desfaçatez foi a chamada “lei-travão”, norma que impede o parlamento de aprovar leis que aumentem a despesa ou reduzam a receita em contexto orçamental. Esta tentativa de condicionar a Assembleia da República, de a esvaziar de sentido e de competências numa altura tão complexa e singular como a que vivemos hoje, é algo verdadeiramente inadmissível numa democracia. É um tique de prepotência de um governo que se sente confortavelmente acima das regras mais básicas de respeito institucional. E o mais estranho é que uma atitude destas não parece provocar mais do que um ligeiríssimo sobressalto na sociedade (ou será um bocejo?), incluindo aqui partidos, jornalistas e comentadores políticos. Parece que passou a ser normal o governo desrespeitar o parlamento. O que seria se esta cartinha viesse assinada por um governo de direita? Caía o Carmo e a Trindade. Sendo remetida pelo governo socialista, é tudo encarado com a maior placidez, como se isto não fosse puro bullying político. Como se não bastasse, vem ainda António Costa dizer que o parecer foi da iniciativa do secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, como se Duarte Cordeiro tivesse agido de mote próprio e não fosse membro do governo. Mas não só: segundo Costa, o inocente parecer era só para lembrar a existência da “lei-travão” aos deputados, já que muitos são novos no parlamento. Se este parecer não é uma brincadeira de mau gosto num tempo que não está para brincadeiras, parece.
PARECE QUE PASSOU A SER NORMAL O GOVERNO DESRESPEITAR O PARLAMENTO