ENVIOU FILHA DE 14 ANOS PARA BAR DE ALTERNE
“O MEU MARIDO APRENDEU CEDO A BATER-ME. SÓ DEUS O PODE CASTIGAR”
Tinha 14 anos e acompanhava o pai para a casa de alterne. Fazia-o quase diariamente, Gracinda não sabe se a menina trabalhava naquele espaço ou se ia como cliente. Admite que seria difícil que fosse para ali de outra maneira que não para vender o corpo. Provavelmente era passada a outros homens, para que fizessem o que o pai também lhe fazia.
Numa entrevista exclusiva ao Correio da Manhã, a mulher que toda a vida calou a violência e os abusos na família, aponta o dedo à filha ainda criança. E protege-se, garantindo que foi ela quem pediu a uma irmã, tia da menina, que a levasse para a Suíça. “Para a tirar daquele inferno”, explica, dizendo que, naquela altura, há mais de 40 anos, era a única que trabalhava. “Ia para o campo para sustentar os meus filhos. Nasceram uns atrás dos outros, como se costuma dizer, e eu tinha de os educar. O que ele ganhava ia tudo para as “‘Três Azinheiras’.”
As ‘Três Azinheiras’, explica depois, era a boîte de que Gracinda fala. E que era frequentada pela filha - uma das vítimas do predador de Tomar, cujos crimes já prescreveram. “Eu ainda lhe dizia para dizer que tinha dores de barriga. Mas sempre que tentava alguma coisa ele batia-me e eu calava-me.”
JUSTIÇA TEM OUTRO ENTENDIMENTO E FALA EM OITO VÍTIMAS DE ATAQUES
ASSEGURA QUE ERA ESPANCADA SEMPRE QUE TENTAVA PROTEGER FILHA
Gracinda, que ontem voltou a falar ao Correio da Manhã, calou-se sempre e fala agora de revolta. Por ter ficado sozinha, por o marido e os filhos terem sido presos. “Parece que [o marido] nem quer comer. Está zangado com isto tudo”, diz, também ela revoltada, porque tinha uma vida ‘boa’. “Desde que ficou cego nunca mais me bateu. Precisava de mim para tudo, tínhamos paz.”
A mulher, que volta a receber-nos na sua casa, também duvida das palavras da neta de 21 anos. “Ela e a mãe sempre disseram trapalhadas.” Sobre o depoimento da prima de 14 anos diz apenas que devia ter denunciado mais cedo. A Justiça tem outro entendimento. E fala em oito vítimas numa família em que a violência era geracional.