Milhões que enganam
PAÍS TEM ÍNDICES DE MOBILIDADE MISERÁVEIS. PROBLEMA NÃO É SÓ DO AVIÃO E COMBOIO
Do saco sem fundo que parece ter bafejado o Orçamento do Estado, o apoio à TAP recolhe generosa parte. Ao todo, estima-se que a transportadora aérea venha a precisar de mais 500 milhões de euros, que se juntarão aos 1200 milhões disponibilizados pelo Estado à empresa a título de empréstimo e que já foram todos gastos. Um despesismo que contraria as previsões do otimista, mas pouco realista, ministro Pedro Nuno Santos. Como a retoma da atividade aérea depende da evolução da pandemia, é provável que este valor possa crescer. Já para a CP, o Governo reservou 468 milhões de euros. É muito dinheiro para mobilidade num país onde a TAP não cumpre integralmente a sua função de servir o Norte e onde circular de comboio não conhece evolução significativa há muitos e muitos anos, transformando o território nacional numa ilha ferroviária em relação à restante Europa. Exemplos: a ligação de 300 quilómetros entre Lisboa e o Porto, feita num comboio que alcança em alguns pontos do trajeto mais de 200 km/hora demora três horas. A realização do mesmíssimo trajeto com comboios iguais já demorou menos tempo pelo que o consumidor dificilmente percebe a regressão quando tantos milhões são investidos. Num país com índices de mobilidade miseráveis, engana-se quem pensa que os problemas dos transportes se limitam ao avião e ao comboio.
Nos transportes rodoviários, a relativa eficácia na ligação dos principais eixos está longe da realidade do Portugal periférico. Outros exemplos: Alcácer do Sal fica a pouco mais de 80 quilómetros de Lisboa. Não tem ligação direta à capital. O trajeto, via Setúbal, demora 2h30. Ao sábado não há carreira. Trancoso dista 27 quilómetros de Sernancelhe. Como não há ligação direta de autocarro, quem quiser viajar entre as duas localidades terá de o fazer via Viseu. São 130 quilómetros e muitas horas. É demasiado terceiro mundista para tantos milhões.