Cultura é antídoto contra a pandemia
ALERTA Sem Cultura e sem espiritualidade, a Humanidade não conseguirá em pleno existir
Onome Jano, antiga divindade romana, relaciona-se com a palavra que significa ‘abertura’ ou ‘porta’ e está bem presente no quotidiano num simples termo como ‘janela’. Mais interessante é o facto de esta entidade ser representada com dois rostos que se opõem, um olhando para trás e outro para a frente, característica que faz de Jano o símbolo da vigilância constante. À atenção ininterrupta junta-se a habilidade para ver perspetivas diferentes (e mesmo opostas) de um problema ou argumentação. Aplicando esta simbologia aos tempos de pandemia, poderia dizer-se que a situação da Cultura tem sido vivida sob o signo de Jano bifronte.
Para perceber a força da Cultura, basta perguntar como poderia o ânimo coletivo ter resistido aos meses mais restritivos do confinamento social, se não tivéssemos acesso a bens culturais básicos como ouvir música, ler um livro ou ver um filme a partir de casa. Todos nos habituamos a partilhar a forma inventiva como os artistas procuram chegar ao seu público, oferecendo criações como quem dá o abraço que a todos ficou interdito. Mas passado o primeiro deslumbramento, tal como ganhou terreno a consciência de que a pandemia está para durar, uma outra realidade dura assume contornos cada vez mais nítidos, assim que se multiplicam os dias com livrarias desertas, as noites com salas de espetáculo fechadas e o cancelamento ou adiamento de boa parte da ati
vidade cultural: a extrema fragilidade que pesa sobre todo um setor profissional, atirando para o limiar da sobrevivência milhares de artistas e as suas famílias. Perante um tal cenário, não basta indignar-se ou, pior ainda, resignar-se. É determinante que as instâncias financiadoras e as entidades promotoras mantenham programas e linhas de apoio; que cada cidadão, sem descurar a segurança, se faça presente nas múltiplas formas de manifestação cultural. Desistir e adiar é mais fácil, mas não pode ser a resposta séria a quem tanto nos dá e tanto de nós é credor.
Regressemos a Jano, do qual se retira o nome do mês que ‘abre o ano’ (janeiro). Que esta quadra marcada pelo Natal e pela esperança num futuro mais sereno nos leve também a assumir esta verdade maior: sem Cultura e sem espiritualidade, a Humanidade não conseguirá em pleno existir.