Dano colateral
Não são apenas os números galopantes desta 4ª vaga da pandemia que nos devem preocupar. Há uma realidade paralela que, desde o início, está a afectar a saúde de milhões de portugueses de forma igualmente impiedosa e mortal. Só que muito mais silenciosamente, sem abrir telejornais todos os dias. Falo dos doentes não covid e de como o Serviço Nacional de Saúde, apesar do esforço sobre-humano dos seus profissionais, tem sido incapaz de lhes dar a resposta necessária. Os custos desta falha do SNS são incomensuráveis, quer para os doentes quer para a sociedade no seu todo. A factura, quando for conhecida na sua totalidade, não vai ser mais leve do que a da covid-19. Ontem, ficámos a conhecer números actualizados: voltou a haver mais de um milhão de pessoas sem médico de família (o que não acontecia há cinco anos), houve menos 13,4 milhões de contactos presenciais médicos e de enfermagem nos centros de saúde (entre março de 2020 e fevereiro deste ano), menos 4,5 milhões de consultas, cirurgias, urgências e internamentos, menos 29 milhões de meios complementares de diagnóstico e terapêutica, quase menos 300 mil rastreios oncológicos (mamografias, cólon e recto), menos 700 mil primeiras consultas hospitalares, menos 176 mil cirurgias programadas e menos 13 mil urgentes. Podia continuar, mas estes números são mais do que suficientes para mostrar a extensão do falhanço do governo em acautelar e salvaguardar a saúde dos portugueses. Quase ano e meio de pandemia devia chegar para o SNS se organizar e apetrechar com os recursos necessários para que ninguém ficasse para trás. Mas o governo continua a não investir suficientemente agora, assim como desinvestiu antes desta crise chegar. Não nos podemos conformar com estes números, como se fossem danos colaterais inevitáveis. Se for preciso, chamem o vice-almirante Gouveia e Melo para esta nova missão: resgatar os doentes não covid.
SE FOR PRECISO, CHAMEM O VICE-ALMIRANTE GOUVEIA
E MELO PARA ESTA
NOVA MISSÃO