ILEGAL “UMA JUSTIÇA PARA RICOS E OUTRA PARA OS POBRES”
CRÍTICAS Paulo Morais lembra que edifício deveria ter sido demolido, mas que ordem judicial nunca foi cumprida DECISÃO Condóminos que compraram em edifício ilegal viram taxas perdoadas
Aguerra do Edifício Cidade do Porto - um shopping bem no coração da Invicta - é mais um dos exemplos de um crime sem castigo, neste caso, urbanístico. O prédio de escritórios e comércio, perto da Rotunda da Boavista, foi promovido pela construtora Soares da Costa e licenciado em 1994, muito depois de a construção se ter iniciado - faltavam mesmo cinco meses para a sua abertura.
O licenciamento violava o Plano Diretor Municipal do Porto, que previa para aquele espaço uma zona verde, e foi por isso denunciado pelo arquiteto José Pulido Valente. Após prolongada litigância judicial, o Supremo Tribunal Administrativo determinou a ilegalidade do licenciamento.
Em 2003, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto ordenou a demolição do edifício, mas a decisão foi suspensa por causa de recursos dos proprietários. Em 2007, o tribunal voltou a ordenar a demolição, dando um prazo de três anos e meio para serem despejados os inquilinos e demolido o prédio. Mas isso nunca aconteceu.
“E o mais grave - e que mostra que o crime compensa - foi que em 2015, a Assembleia Municipal do Porto aprovou uma proposta da câmara para legalizar o edifício – e até isentou os proprietários das taxas que teriam de pagar pela legalização, no valor de mais de 1,4 milhões de euros. Fizeram tábua rasa de todas as decisões anteriores”, afirma Paulo Morais, fundador da Associação para a Integridade e Transparência, que à data de uma das disputas era vereador do Urbanismo no Porto - e defendeu a demolição.
Em 2020, o Tribunal Central Administrativo do Norte reconheceu a sua impotência e, em vez de fazer demolir o Edifício Cidade do Porto, extinguiu a ação de execução da sentença. “O que, no final, fica provado – e exposto em decisão judicial – é que nos crimes dos poderosos todos se conluiam para legalizar o abuso; e os próprios tribunais se declaram impotentes para fazer cumprir a lei. É a prova de que há de facto uma Justiça de ricos e outra de pobres.”
“O QUE MOSTRA QUE O CRIME COMPENSA FOI O QUE A CÂMARA FEZ”