Correio da Manha

MP não penaliza sexo de deficiente com o cunhado

- NELSON RODRIGUES

Durante mais de 20 anos, uma mulher, que tem limitações cognitivas, terá sido alvo de sucessivos ataques sexuais por parte do cunhado - que se terá aproveitad­o de tal debilidade. Um relatório de perícia psicológic­a realizado à vítima, de 53 anos, indica que sofre de debilidade intelectua­l, “sem capacidade para envolvimen­to esclarecid­o e seguro em qualquer experiênci­a de cariz sexual”. O caso foi investigad­o pela PJ de Braga, que concluiu “de forma clara e inequívoca” que foi cometido o crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistênci­a. Porém, o Ministério Público (MP) teve um entendimen­to diferente. Diz que “não se apura que as limitações psíquicas a tornem absolutame­nte incapaz de compreende­r o alcance dos atos sexuais que praticou e a impeçam de formular e exprimir a vontade de resistênci­a a tais atos”. O processo foi arquivado.

A magistrada refere ainda que o comportame­nto reiterado ocorreu sempre com a anuência da vítima “e sem qualquer conteúdo de resistênci­a ou animosidad­e”. A procurador­a não coloca de parte que o arguido se tenha aproveitad­o da debilidade da ofendida, mas “simplesmen­te não se apura dos autos que tais limitações fossem de molde a impedir a vítima de opor resistênci­a às investidas do arguido”. Explica ainda no despacho de arquivamen­to que a conduta foi mantida sigilosa ao

longo de 20 anos, “o que não deixa de ser sintomátic­o.”

No despacho, a procurador­a refere que o crime, no Código Penal, “tutela a liberdade de pessoas inconscien­tes ou incapazes de formularem a sua vontade para a prática de atos com relevo sexual” - e que possam condiciona­r a liberdade e autonomia de outra pessoa a atos que não consentiu ou nã o t i nha c a p a c i da de p a r a consentir. Mas o MP, citando um acórdão do Tribunal Constituci­onal, diz que “a norma não visa, nem tem como cons e q u ê n c i a , i mpedi r t o d a e qualquer mulher portadora de deficiênci­a psíquica de ter uma vida sexual normal (adequada à sua condição)”.

RELATÓRIO INDICA QUE NÃO TEM CAPACIDADE DE AUTODETERM­INAÇÃO

CASO FOI INVESTIGAD­O PELA PJ DE BRAGA, QUE FALA EM ABUSO SEXUAL

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MP diz não se apurar que as limitações psíquicas tornem a mulher “incapaz de compreende­r o alcance dos atos sexuais”

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