Portugal partido
Ameros dias das Legislativas, a situação é muito diferente de há apenas umas semanas. A campanha e a pré-campanha foram decisivas para isso. Lembremo-nos: Luís Montenegro fez o primeiro debate a 6 de Fevereiro. Até aí, vivia-se um ambiente de pré-entronização de Pedro Nuno Santos. Com um grupo de `cheerleaders' nas redacções de jornal e televisão como há muito não se via, Santos preparava-se para uma passeata, por aí a discursar naquele seu estilo homiliar, tipo Obama da Mealhada, até à consagração. O anverso era um Montenegro acabrunhado, em eventos semi-desertos, género cabaret de terceira, sem muito para dizer. E depois, a AD não `arrancava': a operação de apresentação no dia do congresso do PS foi um desastre, o programa económico foi abafado pelo escândalo da Madeira, nada corria bem e o PS continuava à frente nas sondagens. Veio então o debate com Mariana Mortágua, que Montenegro controlou completamente. As coisas começaram a mudar aí.
Nos debates, apareceu outro Montenegro: agressivo, ágil, aparentemente preparado, que teve os seus momentos altos contra André Ventura, ao recusar sem equívocos entendimentos com o Chega, e Inês Sousa Real, quando, impromptu, rechaçou a conversa de Gonçalo da Câmara Pereira sobre `palitos' e pancada na mulher. De repente, tudo começou a parecer diferente: a AD `arrancou', passou a dar a impressão de ser alternativa credível e a aparecer à frente nas sondagens. Montenegro foi a maior surpresa da campanha. Claro que só as eleições confirmarão a dita `dinâmica de vitória', mas pelo menos criou-se um ambiente em que se vislumbra alternativa ao PS, o que, independentemente de preferências e resultados, é saudável para a democracia. Falta uma semana para o voto e a AD tem conseguido tirar do baú vários tesourinhos deprimentes que ameaçam a vitória, como o aborto ou as milícias rurais. Mas
A AD tem conseguido tirar do baú vários tesourinhos deprimentes que ameaçam a vitória
mesmo aí Montenegro tem conseguido desenvencilhar-se com certa graça.
Este é o prato forte das eleições. Mas há outros focos de interesse: qual será a fragmentação parlamentar e que `governabilidade' daí sairá? Até onde irá o Chega? Até que ponto cairão BE e PCP, afectados pela co-responsabilidade na governação e no declínio dos serviços públicos? Irá o Livre ultrapassar o PCP, ou até o BE, o que seria uma enorme mudança tectónica na esquerda?