Destak

«Queria, realmente, fazer algo diferente. (...) Com este filme falo, pela primeira vez, como adulto»

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destes 25 anos, eu tivesse inspirado, absorvido, contido, guardado. Desta vez pude deitar essa minha voz cá para fora. Nesse sentido, este filme é mais exato que os outros. Há nele uma grande energia, uma quase ausência de fricção, um esforço coletivo. É um tipo de obra muito difícil de concretiza­r. Se formos a ver o que o filme quer fazer, se tentarmos perceber quais são os objetivos e ambições, é uma peça que consegue fazer quase o impossível. Que alvo queria o filme atingir? Quase que se parece com um filme musical. Ou com um ‘thriller’. Ou com uma comédia. Talvez se pareça com uma carta de amor à grande variedade que existe na arte do cinema. Mas, para além dessas referência­s, queria que fosse um objeto sólido e único do ponto de vista emocional e artístico. Queria que fosse um momento de exaltação.

Fico com a impressão de que esta fase da sua vida parece ser um novo começo para si…

Ainda não sei bem do que se trata, tudo isto. Mas é, de facto, uma fase nova. Tinha 52 anos quando dei comigo a pensar: ora bem, que vou eu fazer com este filme? O que é que ainda não tentei antes? Portanto, sim, o filme aconteceu e foi produzido na sequência de um propósito claro e que me chegou por vias muito consciente­s. Queria, realmente, fazer algo diferente. Eu pelo menos, senti isso. Espero que também o espectador sinta de algo semelhante. Pode ser que, quando estamos a ver o filme, a viagem traga à memória outros temas que abordei anteriorme­nte. Nesse sentido, a nova história é uma súmula de muita coisa. É uma síntese. Uma síntese de muitos assuntos que, ao longo dos anos, fui aludindo nos trabalhos que ia fazendo. No meio disso tudo, quera que o filme fosse uma novidade. Queria que nos trouxesse sensações novas.

Onde é que vê essas grandes novidades?

Os nove filmes que tinha feito antes eram uma espécie de reencaminh­amento, uma espécie de linguagem que encontrei para os meus grandes mitos de infância. Foram nove filmes a contar a minha mitologia ancestral. Com este filme falo, pela primeira vez, como adulto.

O que é que, de maneira deliberada e consciente, achou que deveria ser dito?

Achei que era muito importante falar de identidade, falar das outras partes do que somos, falar de compreensã­o e empatia e intimidade e sexo, falar do verdadeiro significad­o de amor. Falar do ato de amar. Era essencial que, quase que de dois em dois minutos, o ecrã mostrasse água. Queria que houvesse sempre muita água em movimento. E queria que o filme tivesse grandes painéis centrais com água, grandes peças centrais com água cheia de vida. É por isso, também, que o prólogo da história foi feito daquela maneira. Em estilo musical, a câmara não se detém e flui como água. Sempre sobre carris e através de um guindaste. Flui por ali adentro. Quando a protagonis­ta acorda, o sonho que estava a ter tinha muita água. Levanta-se, vai cozer ovos com água, masturba-se debaixo do chuveiro, passa uma camada de graxa líquida nos sapatos e vai para o emprego.

«Achei que era muito importante falar de identidade, (...) falar de compreensã­o e empatia e intimidade»

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© FOTOS DR

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