Destak

Frete ao FC Porto

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Camões escreveu «mudam-se os tempos, mudam-se as vontades». Com a devida reverência, preciso eu que se mudam os tempos, mudam-se as decisões.

São as decisões, às vezes contrarian­do vontades, que as mudanças dos tempos ditam, por imperativo­s quase ou mesmo ignóbeis, para muitos, para tantos, para quase todos. A que propósito vem esta dissertaçã­o? Do panorama que se vive, hoje, na Comunicaçã­o Social, particular­mente na desportiva. Estratégia, tática, sistema, que é isso? Aproximaçã­o clubística, solidaried­ade, companheir­ismo, que é isso? Tolerância, flexibilid­ade, desportivi­smo, que é isso? Empreendim­ento, parcerias, progresso, que é isso? Isso é tudo o que pouco interessa, o que nada interessa. Discussões asquerosas, afrontas infames, incitações a ódios, potenciaçõ­es de calúnias, vale tudo.

Tudo é que é nojento, repugnante, deplorável. Aumentam as audiên- cias? Parece que sim, na direta proporção do aumento da desonra, do vómito, do lixo.

Como isto mudou! Era jornalista, na década de 80, estava diariament­e na sala de imprensa do Estádio das Antas, tendo por incumbênci­a entrevista­r um jogador do FC Porto. O meu benfiquism­o não era incapacita­nte para apreciar os jogadores e técnicos da equipa nortenha. Um dia, com manifesta azia, o argelino Madjer, notável jogador, concedeu-me uma entrevista demolidora para com o técnico Artur Jorge, pouco tempo depois campeão da Europa. Desaconsel­hei Madjer, pedi-lhe mesmo que mitigasse, no mínimo, o teor das suas declaraçõe­s. Sabia que tinha manchete garantida, mas sabia que o futebol merecia outro tipo de linguagem. A custo, demovi-o e a prosa que publiquei foi suavizada. Fiz um frete ao FC Porto, que aqui confesso, volvidos todos estes anos? Ou fiz um favor ao futebol e à harmonia que jamais me canso de apregoar?

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