«Eu era mais o tipo de miúdo que tentava recriar em casa qualquer coisa que tinha visto no cinema»
Seis meses!?!?
Isso mesmo. Fui submetido a seis testes. Um por mês. Comecei a triagem em outubro de 2015 e só em março de 2016 é que fui escolhido. Telefonaram-me a dizer que tinha ficado como papel no momento em que estava a editar uma curta-metragem que eu mesmo tinha realizado. Fui lá fora buscar uma bebida e recebi o telefonema. Fiquei absolutamente estarrecido. Naturalmente, nestas andanças, quando um ator consegue ficar com um papel, vai logo fazer uns telefonemas e ouve os amigos e os familiares a dizer algo do tipo “Wow”. No caso do Han Solo, telefonei e do outro lado só ouvi silêncio. É uma personagem de tal modo icónica e gigantesca que os meus interlocutores nem sequer souberam como reagir ou o que dizer. Foi muito estranho. Lembro-me de ir visitar o meu irmão mais velho e de deparar com os miúdos dele a brincar com bonequinhos da saga Star Wars. Não se consegue descrever a sensação de saber que, daqui a uns dias, entre aquelas figuras de super-heróis e personagens absolutamente míticos vai haver uma versão de mim. Em tamanho Lego. Que o cão irá roer de imediato.
Lembra-se de, quando era criança e voltava da escola, brincar mais com a figura do Luke Skywalker ou ia logo buscar o bonequinho do muito mais rebelde, inconformista, solitário Han Solo?
Pois, era mesmo assim. No meu caso, tinha lá em casa não só a figurinha do Luke Skywalker: tinha ao lado o sabre luminoso com que eu brincava horas a fio, mas também o Han Solo e toda os apetrechos que faziam parte da sua identidade. Mas, nisso das brincadeiras que eu transportava do cinema para a vida caseira, eu era mais o tipo de miúdo que tentava recriar em casa qualquer coisa que tinha visto no cinema. Não importava qual a personagem, eu chegava a casa e tentava ser aquilo que vi na tela. Lembro-me de uma vez ter ido ver uma comédia com o Jack Lemmon e o Walter Matthau. Cheguei a casa e fui logo vestir um fato de homem de negócios. Não tinha necessariamente de ser ‘cool’. Mandaram-me para a Europa, porque uma parte substancial do filme iria ser feito nos estúdios de Pinewood, perto da cidade de Londres. Cheguei lá e senti-me exausto por causa do voo longo e da enorme diferença horária. Não tinha dormido nada. Mesmo assim, disse para comigo: sem problema, isto está a correr bem. Sentei-me aos comandos da nave Millennium Falcon. Senti o corpo a ser trespassado por uma excitação que era difícil conter. No entanto, a meio da tarde todo aquele cansaço acumulado, toda falta de sono, toda a diferença horária caíram-me no corpo como uma montanha de chumbo. Foi aí que me apareceu à frente o Chewbacca. Tinha para aí 3 metros de altura. Lá dentro do fato havia um sujeito com rímel negro à volta dos olhos. Disse
“Olá, tudo bem?”. Acho que foi aí que eu me senti, por completo, dentro de um filme do David Lynch.
«[Quando entrei na Millenium Falcon] senti-me trespassado por uma excitação que era difícil conter»