«O código moral desta história é muito sério»
Lenda viva da 7ª Arte afro-americana e nome maior do cinema “Made in USA”, Spike Lee está de volta e, como sempre, pretende agitar as águas: com o novo e aclamado “Blackkklansman” o cineasta regressa à boa forma.
Nasceu em 1957. Peixes. Mudou para sempre, quando irrompeu em cena nos finais de 1980 com os clássicos She’s Gotta Have It e Do The Right Thing, a maneiracomotodoocinemaamericano passou a retratar a minoria negra, essa parte vital da América e de todos nós. Desde essa altura que, autor, tem insistido num estilo penetrante, de volume no máximo, com as doses necessárias de grito e grafismo, panfleto, protesto e ultraje. A sua nova obra magna aparece numa época em que a Casa Branca tem um ocupante incapaz de se insurgir enquanto os neonazis de Charlottesville vão cortando o país com fachos acesos. Bónus especial: este vibrante e inacreditável conto de terror e comédia chamado Blackkklansman tem, como é hábito na obra de Spike Lee, apresenta grandes trabalhos dramáticos, guarda--roupa, música, nervo e graça, tudo entregue sem discurso moralistaoumarteladaideológica,apesarde a mensagem ser absolutamente pertinente. O mestre está de volta, sem dar tréguas e sem aceitar o cliché do discurso oficial. Bem haja.
Explique: como conseguiu fazer um filme que equilibra tão bem a mensagem política com a necessidade de entreter a plateia?
Ainda bem que o filme, como peça de entretenimento, consegue fazer isso mesmo: divertir uma plateia. Mas note igualmente que nem tudo neste filme é feito para, simplesmente, divertir pessoas que se sentem aborrecidas. O código moral que a história encerra é muito sério. Não é a primeira vez que faço as coisas assim. O mesmo já acontecera com Do The Right Thing – o que temos ali é uma história de grande gravidade e que termina, como se lembrará, com o estrangulamento mortal de Radio Raheem às mãos da polícia de Nova Iorque. Mesmo no caso de alguns dos filmes que são agora considerados clássicos, como é o caso do A Laranja Mecânica, do Stanley Kubrick, tinham uma grande componente cómica apesar de o tema de fundo ser o fim de mundo tal como ele tem existido até agora. Mesmo um dos seus atores prediletos, o Peter Sellers, caminhou sempre ao longo desse precipício que separa a comédia dos temas de grande gravidade social e moral. Este tipo de exercício é realmente uma grande acrobacia.
Se o presidente Trump visse este filme, como acha que reagiria?
Boa pergunta, até porque desde o início do cinema que a Casa Branca tem organizado vários visionamentos de filmes. O grande clássico Birth ofa Nation, do realizador D. W. Griffith, foi projetado numa das salas da Casa Branca durante o mandato de Woodrow Wilson – e, como se sabe, a grande citação que saiu desse momento foi quando o presidente disse que aquele filme equivalia a «escrever as linhas da História com a luz de um relâmpago». Mas não sei se o Trump se vai mostrar disponível para ver este filme. Devia ver. Ele e todos os que o rodeiam.
Mas a história é verídica? Parece, de fio a pavio, uma comédia…
Um livro a contar tudo acabou de ser reeditado. Também pode confirmar tudo através das declarações proferidas pelo próprio grão-duque e mestre do Ku Klux Klan, David Duke.
«Ainda bem que o filme, como peça de entretenimento, consegue fazer isso: divertir uma plateia»
Tudo aquilo foi dito assim? Aquelas coisas sobre a superioridade e inferioridade das raças, sobre a origem e etnia?
Tudo verdade. Fatual.