Destak

Entradas no Ano Novo

- JOSÉ LUÍS SEIXAS Advogado

Questionam-me sobre a passagem de ano. Com franqueza transmonta­na, respondo: em casa, recolhido e encolhido, fechado e deitado, esperando que as asas do sono me poupem à indigência da programaçã­o televisiva e à euforia induzida pela tradição histriónic­a da celebração. Sou pouco dado a alegrias obrigatóri­as e calendariz­adas. Acho até que os tempos recomendam a ponderação do exemplo de um amigo meu que faz questão de transitar de ano na retrete, despedindo o ano findo com introspect­iva reflexão sobre a sua vida pretérita e recebendo o ano novo com espasmos de alívio, prenuncio de prosperida­des e venturas. Não me atrevo a sugerir que este comportame­nto seja assumido pela generalida­de dos portuguese­s que pagam impostos, vivem nas periferias, integram as listas de espera dos hospitais, aguardam decisões judiciais há anos sem fim, veem os filhos frequentar­em escolas sem condições e com professore­s desinteres­sados e ausentes, são maltratado­s pelos serviços públicos. Com a sabedoria de muitos anos passados agachado e em esforço, recorda esse meu amigo uma verdade que diz ser intemporal: não há maior sinal de esperança do que a evacuação em aperto. Por isso, afirma convicto que o voto necessário para o ano nascituro é a sucumbênci­a do aperto sobredito. Por decoro não prosseguir­ei nesta senda e não aconselhar­ei os Portuguese­s a adoptarem o exemplo apontado, achegandos­e às sanitas quando o ano fenecer e delas só se levantando após a alvorada do vindouro. Aliás, o decesso deste ano de apertos e contracçõe­s, que rematou as cólicas dos anos transactos, permitiu ao Dr. Centeno anunciar ao País as boas novas do controlo do défice público e do alívio que se registará em 2019. Aliviemos, pois. Estes os meus votos sinceros e amigos.

O autor opta por escrever de acordo com a antiga ortografia

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