«Dar atenção é dar imenso poder»
Quando a sociedade norte-americana se confronta consigo mesma devido aos constantes massacres com armas de fogo, Natalie Portman volta ao grande ecrã com o novo poderoso filme sobre os tempos que vivemos
Mesmo que o leitor esteja ciente de que Natalie Portman é uma cidadã israelita cujo nome verdadeiro nem sequer é Natalie Portman, isso não quer dizer que já tenha compreendido com que contas ela desfia o seu rosário. Amudançadenomeépassocauteloso de artista, embora também fique assente que a senhora gosta de manter um certo anonimato (ler: viver bem longe da esfera corriqueira do estrelato) e insistaemservistacomopáginaembranco de cada vez que aparece a conduzir uma nova história. Um fã de Natalie Portmannuncasabeoqueesperardela. Desde o início que é assim, a garota feita supermulher. Natalie Portman começou por surpreender o público internacionalnumafantasiaviolentadeluc Besson, colaborou depois com George Lucas e viveu de perto o renascer da galáxia Star Wars, ganhou o prémio maior da Academia graças à fragilidade de ferro que mostrou no Black Swan, dedarrenaronofsky,e,comojávaisendo óbvio, adora viabilizar as mensagens menos agradáveis do chamado cinema de autor. Uma carreira tão jovem que éexpansivaeépicamas,sobretudo,interiorizada nas várias lutas que persegue. Este ano, depois de já ter trabalhado tão memoravelmente no filme Annihilation, ela, menina, sempre lá em cima no trapézio perigoso da reinvenção,surgenoexuberantevoxluxcomo íconedamúsicapopquegereumtrauma de violência. Futurismo perturbantepelamãointensadaartistarebelde? Sim, por favor.
Este seu novo filme tem bastantes coisas a dizer sobre o mundo do espetáculo social que vivemos todos os dias atualmente. Que temas debateu com o realizador antes e durante as filmagens?
O que percebi desde logo foi que o Brady Corbett queria contar uma história, não sobre a I Grande Guerra, não sobre a II Grande Guerra, mas sobre as guerras atuais que nos afligem. Para ele, os tiroteios nas escolas são sinal de que estamos a atravessar uma guerra civil nos Estados Unidos da América. Os massacres frequentes são como que uma espécie de terrorismo que afeta diretamente a maneira como vivemos e a cultura que é produzida. Basta ligar um noticiário televisivo para se perceber o que se passa: uma carnificina num liceu é anunciada no mesmo espaço noticioso que também contém, por exemplo, a divulgação de um divórcio entre duas estrelas de cinema. Há no filme um momento em que falamos concretamente disso, quando o repórter pergunta à cantora se vê alguma ligação entre ela e os terroristas, e ela responde algo como “não encontro grandes semelhanças entre as duas coisas, a não ser no facto de, também no meu caso, se deixar de me prestar atenção eu não existo”. É disso que falamos, do poder que se dá a essas pessoas na imprensa ou na televisão, quando disponibilizamos uma plataforma que lhes permita ter um público. Dar atenção é dar imenso poder. Há uma combinação mortal que se estabelece nesse momento. Para além da violência, ela, a minha personagem, acha que agora pode dizer o que lhe apetece com impunidade total. Isso, sim, reflete perfeitamente o que estamos a viver.
Como surgiu a ideia de avançar com uma parceria com a cantora