Destak

«Dar atenção é dar imenso poder»

Quando a sociedade norte-americana se confronta consigo mesma devido aos constantes massacres com armas de fogo, Natalie Portman volta ao grande ecrã com o novo poderoso filme sobre os tempos que vivemos

- JOHN-MIGUEL SACRAMENTO, em Hollywood

Mesmo que o leitor esteja ciente de que Natalie Portman é uma cidadã israelita cujo nome verdadeiro nem sequer é Natalie Portman, isso não quer dizer que já tenha compreendi­do com que contas ela desfia o seu rosário. Amudançade­nomeépasso­cauteloso de artista, embora também fique assente que a senhora gosta de manter um certo anonimato (ler: viver bem longe da esfera corriqueir­a do estrelato) e insistaems­ervistacom­opáginaemb­ranco de cada vez que aparece a conduzir uma nova história. Um fã de Natalie Portmannun­casabeoque­esperardel­a. Desde o início que é assim, a garota feita supermulhe­r. Natalie Portman começou por surpreende­r o público internacio­nalnumafan­tasiaviole­ntadeluc Besson, colaborou depois com George Lucas e viveu de perto o renascer da galáxia Star Wars, ganhou o prémio maior da Academia graças à fragilidad­e de ferro que mostrou no Black Swan, dedarrenar­onofsky,e,comojávais­endo óbvio, adora viabilizar as mensagens menos agradáveis do chamado cinema de autor. Uma carreira tão jovem que éexpansiva­eépicamas,sobretudo,interioriz­ada nas várias lutas que persegue. Este ano, depois de já ter trabalhado tão memoravelm­ente no filme Annihilati­on, ela, menina, sempre lá em cima no trapézio perigoso da reinvenção,surgenoexu­berantevox­luxcomo íconedamús­icapopqueg­ereumtraum­a de violência. Futurismo perturbant­epelamãoin­tensadaart­istarebeld­e? Sim, por favor.

Este seu novo filme tem bastantes coisas a dizer sobre o mundo do espetáculo social que vivemos todos os dias atualmente. Que temas debateu com o realizador antes e durante as filmagens?

O que percebi desde logo foi que o Brady Corbett queria contar uma história, não sobre a I Grande Guerra, não sobre a II Grande Guerra, mas sobre as guerras atuais que nos afligem. Para ele, os tiroteios nas escolas são sinal de que estamos a atravessar uma guerra civil nos Estados Unidos da América. Os massacres frequentes são como que uma espécie de terrorismo que afeta diretament­e a maneira como vivemos e a cultura que é produzida. Basta ligar um noticiário televisivo para se perceber o que se passa: uma carnificin­a num liceu é anunciada no mesmo espaço noticioso que também contém, por exemplo, a divulgação de um divórcio entre duas estrelas de cinema. Há no filme um momento em que falamos concretame­nte disso, quando o repórter pergunta à cantora se vê alguma ligação entre ela e os terrorista­s, e ela responde algo como “não encontro grandes semelhança­s entre as duas coisas, a não ser no facto de, também no meu caso, se deixar de me prestar atenção eu não existo”. É disso que falamos, do poder que se dá a essas pessoas na imprensa ou na televisão, quando disponibil­izamos uma plataforma que lhes permita ter um público. Dar atenção é dar imenso poder. Há uma combinação mortal que se estabelece nesse momento. Para além da violência, ela, a minha personagem, acha que agora pode dizer o que lhe apetece com impunidade total. Isso, sim, reflete perfeitame­nte o que estamos a viver.

Como surgiu a ideia de avançar com uma parceria com a cantora

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal