Debate sobre a reforma do Estado começou torto
AVISO Peritos nacionais e estrangeiros dizem que debate está mal focado. Começou- se pelo fim, pelo dinheiro a poupar
Peritos internacionais em administração pública e vários portugueses especializados na área indicaram que o debate sobre a reforma do Estado em Portugal começou mal ou, pelo menos, de forma bastante enviesada.
Em novembro, o Governo lançou a discussão apontando para metas quantitativas para cortar na despesa e já disse que “o Estado possível” terá de ser mais pequeno. O FMI já lançou um estudo recheado de metas ( para o número de empregados inclusive) para reduzir pelo menos 4000 milhões de euros em dois anos.
No entanto, não se refletiu sobre que tipo de Estado se quer em Portugal, independentemente da dimensão; não se sistematizaram “os erros mais comuns” cometidos noutros países, lamentaram vários especialistas na conferência que decorreu ontem e se prolonga pelo dia de hoje, em Lisboa, organizada por Banco de Portugal, Conselho de Finanças Públicas ( CFP) e Fundação Gulbenkian.
É errado reduzir o debate sobre a reforma do Estado em Portugal a“estereótipos como grande é mau, pequeno é bom”. “O debate não pode ser feito desta forma”, pediu Geert Bouckaert, da Universidade de Lovaina, um dos maiores especialistas europeus em administração pública.
“Querem um Estado como? Centralizado ou descentralizado, regulatório ou participativo?”. “É isto que está na ordem do dia”, insistiu.
A posição de Bouckaert colide, por exemplo, com a do FMI e do ministro das Finanças, que nos seus contributos recentes defenderam que o único Estado possível de pagar em Portugal é um mais reduzido.
“Portugal tem um Estado centralizado. Provavelmente, precisam de descentralizar mais. Estas tendências estão em debate até nos estados escandinavos”,
O inglês Christopher Pollitt, também da Universidade de Lovaina, elencou os erros mais comuns quando se lança reformas e que depois as colocam em risco mais tarde: “prescrição da solução antes de fazer o diagnóstico”, “falhar na construção de coesão suficiente para fazer a reforma”, “capacidade de implementação insuficiente”, “falta de aplicação sustentada ao longo do tempo”, “ignorar fatores locais”.
“Estamos objetivamente a desmotivar toda a gente”, disse António Correia de Campos, exministro do Governo PS. Num comentário à intervenção de Giovanni Valotti, da Universidade de Bocconi, o eurodeputado lembrou os cinco pilares em que deve assentar uma reforma apontados pelo italiano: “medição do desempenho, aumento da transparência, aumento da motivação dos funcionários, aumento da confiança no Governo e melhoria da liderança”. O ex- ministro concedeu que houve melhorias ao nível da transparência. No resto, não.
Na abertura, Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, falou da necessidade de um novo contrato social. Teodora Cardoso, presidente do CFP, disse que as propostas do FMI para cortar despesa “são superficiais”.