O mar como vector estratégico para o desenvolvimento sustentado de Portugal
Oenquadramento geopolítico, geoestratégico de Portugal e a sua identidade histórica são determinantes para que o País possa tirar partido do seu potencial estratégico. Porém, isso só será possível através de uma estratégia nacional ( ou grande estratégia global do Estado) que seja consequente – não estabelecida e que garanta a continuidade das opções assumidas – e alicerçada na integração das várias políticas nacionais para cada sector do Estado.
Essa grande estratégia global do Estado deveria assim ter em conta a opção pela vertente do mar já consubstanciada na estratégia nacional para o mar ( 2006- 2016). Ou seja, a afirmação do País pelo mar deve ser tomada como essencial para perspectivar o crescimento económico, assegurando um desenvolvimento sustentado e segurança, de forma a garantir o bemestar social.
A grave crise que o País enfrenta exige um novo paradigma de desenvolvimento, que só uma adequada concepção da estratégia nacional permitirá enquadrar, de forma coerente, as reformas estruturantes que o País reclama.
Todavia, existe uma cultura de “governos de gestão”, que parece ter esquecido o método da estratégia. Isto é, formular uma visão e objectivos a atingir, de acordo com o País e aquilo que somos, no seu espaço, população, recursos e estruturas, para avaliar capacidades, potencialidades e vulnerabilidades – num exercício prospectivo de médio e longo prazo –, tendo em conta o enquadramento do ambiente estratégico.
Portugal não é um país pequeno e da periferia se tivermos em conta a extensão da nossa plataforma continental ( PC) e a posição estratégica de charneira entre três continentes – Europa, África e América – em que o mar lhe confere centralidade atlântica. Além disso, sendo o mar um elemento comum dos países da CPLP, poderá conferir projecção estratégica a Portugal na ligação à Europa e ao Atlântico Sul, bem como Sudeste Asiático e Oceânia.
O mar e o controlo do seu uso continuam a assumir uma grande importância, como via de comunicação e fonte de recursos naturais. O País que possui uma Zona Económica Exclusiva ( ZEE) equivalente a 20 vezes o território terrestre, sendo a 3. ª mais extensa da UE e 11. ª maior área a nível mundial – a sua dimensão corresponde à superfície terrestre ocupada por Espanha, França, Itália e Alemanha. O espaço marítimo resultante da fusão da ZEE e da extensão da PC será equivalente à dos países da UE ( ou da Índia). Ou seja, mais de 40 vezes o território nacional, passando 97% do território a ser de natureza marítima.
Pelo mar são enviadas mais de 60% das nossas exportações, estamos dependentes em cerca de 70% das importações, é recebida a totalidade do petróleo e 2/ 3 do gás natural que o País consome e pelas águas de jurisdição nacional passam cerca 53% do comércio externo da UE.
Importa também potenciar as vantagens competitivas únicas que os portos e, em especial, o porto de águas profundas de Sines – tirando partido do factor geoestratégico – podem proporcionar como porta atlântica da Europa em articulação com a rede de plataformas logísticas, quando se perspectiva uma enorme revolução nos fluxos do comércio mundial, provocada pelo novo canal do Panamá.
Portugal é uma nação euroatlântica, que tem o território com características arquipelágicas – espaços marítimos de soberania e responsabilidade nacional com importantes rotas marítimas e re- cursos –, cuja extensão e importância económica lhe conferem elevado potencial estratégico. Mas no seu espaço interterritorial é indispensável ter presente que só com segurança se desenvolve a normal actividade económica ( protecção security e segurança safety).
Sendo o País essencialmente marítimo, não pode deixar de zelar pela segurança do mar face às novas ameaças e riscos, mantendo uma marinha de guerra e mercante credíveis para defesa dos seus interesses e apoio à cooperação multilateral. Por isso, o mar deverá também constituir um factor essencial no âmbito de um conceito estratégico de segurança nacional, que englobasse as diferentes dimensões do desenvolvimento e da segurança.
As explorações da PC revelaram espécies marinhas raras para a utilização em medicina de ponta, elevada probabilidade de existência de hidrocarbonetos, minério em estado de elevada pureza e fontes hidrotermais.
Sendo a opção pelo mar um objectivo político nacional, Portugal terá de proteger e valorizar o recurso que o mar representa para o nosso país. Na estratégia para o mar foram estabelecidos os objectivos, as acções prioritárias e as correspondentes medidas. Contudo, não se encontram identificados os meios adequados. Apesar de já terem decorrido alguns anos, várias iniciativas e dos apelos do Presidente da República, ainda não é visível concretização dos objectivos dessa estratégia, que têm vindo a ser adiados. É necessário a adequação do enquadramento legislativo – ordenamento dos espaços marítimos – para que seja possível atrair investimentos, de forma sustentada, com adequados meios financeiros.
Tem- se falado muito no mar como desígnio nacional de uma nova realidade, quando o País se vê confrontado com uma grave crise económica e financeira. Portugal tem de saber defender os seus interesses vitais, tendo em conta a nação marítima que sempre foi e continuará a ser pela sua geografia, história e carácter do seu povo.
Não basta falar do mar para que ele seja valorizado. É preciso planear, organizar e implementar o pensamento estratégico. E é da sua qualidade e determinação para a concretização que dependerá a diferença entre o fracasso e o sucesso.
Desde a integração na UE que temos vivido de costas voltadas para o mar. Importamos cerca de 70% do peixe, quando devíamos ser o maior exportador. Tínhamos uma marinha mercante e indústria de construção naval que é praticamente inexistente. A Bélgica, com uma costa de reduzidas dimensões, produz cerca de três vezes mais riqueza do mar.
A estratégia só poderá alcançar os seus objectivos se o mar for considerado por todos como um verdadeiro projecto nacional. O mar é uma fonte de riqueza incalculável, pelo que Portugal não pode assim perder a oportunidade de potenciar os seus recursos, que representam actualmente apenas cerca de 2% a 3 % do PIB, sendo possível aumentar o seu impacte para 6%. Os estudos efectuados referem que poderão vir a representar 15 a 20 mil milhões de euros, duplicando o seu peso na riqueza nacional em 2025.
Em síntese, no momento em que o País atravessa uma grave crise, cujo modelo de desenvolvimento se encontra esgotado, falta concretizar a opção pelo mar, alcançando os objectivos políticos já sucessivamente definidos. Mas só são possíveis de concretizar através de uma estratégia nacional, fazendo prevalecer a mais- valia oceânica e o respectivo potencial em termos de valor e poder, contribuindo para que seja possível resgatar o futuro de Portugal.