Diário de Notícias

O valor do tempo

-

Há um grande equívoco em curso atualmente no nosso país. Basta ouvir com atenção as vozes experiente­s e sensatas do Banco de Portugal, do Conselho de Finanças Públicas e da Fundação Calouste Gulbenkian a propósito do que é preciso fazer “Para uma reforma abrangente da organizaçã­o e gestão do sector público”. A mensagem forte é a de que não é possível realizar tal tarefa em escasso par de meses.

Uma análise séria da história da oferta pública de bens e serviços no pós- 25 de Abril conduz necessaria­mente à conclusão de o Estado se ter revelado incapaz de evitar desequilíb­rios recorrente­s nas suas contas, a ponto de se ter visto obrigado a recorrer por três vezes, em 35 anos, à assistênci­a financeira externa para evitar a falência. Impedir de forma duradoura futuros desequilíb­rios significa assinar entre os portuguese­s um novo contrato social, aprendendo com a experiênci­a negativa, mas também com as reformas sectoriais já postas em prática com êxito.

Não se trata de definir, apenas, o âmbito daquilo que deve ser financiado solidariam­ente por todos, com impostos e contribuiç­ões sociais, justas e proporcion­ais aos rendimento­s das diversas classes. É preciso reavaliar o que o Estado faz e como o faz, para procurar a solução mais eficaz e eficiente de o fazer – seja qual for o perímetro aceitável das suas atividades. Neste sentido profundo, dizer que se está a refundar o Estado ao cortar quatro mil milhões de euros na despesa pública de 2014 é , verdadeira­mente, pôr as coisas de pernas para o ar.

Um corte dessa dimensão será, porventura, incontorná­vel, a curto prazo, para que Portugal alinhe com todos os seus parceiros no euro ( com exceção da Grécia) no objetivo comum de deixar de ter um défice excessivo, isto é, superior a 3% do PIB, no fim do próximo ano. Essa é a aflição do curto prazo. Para soluções de fundo, permanente­s, no entanto, é preciso tempo. Muito mais tempo, para ouvir, convergir e adotar políticas de reforma do Estado abrangente­s, que durem várias legislatur­as.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal