“Não fazia mal um Governo de inclusão nacional”
Radical do centro excêntrico. É assim que se define este professor, que hoje apresenta em Lisboa um novo livro. Ao Dndiz que bastaria a palavra do Presidente para alargar os horizontes aritméticos de uma maioria no Parlamento
Este livro é um retrato do eventual falhanço da democracia? Antes pelo contrário, o livro defende o sistema democrático, denunciando causas que nos levaram a esta crise, como o indiferentismo dos cidadãos. É antes a denúncia do que é o sentir quotidiano desses cidadãos. E o falhanço do capitalismo? Também não. Paradoxalmente, o capitalismo democrático tem sido o menos péssimo de todos. A humanidade está melhor do que estava, nós é que estamos em crise, mas a crise precede as decisões. O que está em causa é o partido dos fidalgos, não o sistema. Esse partido dos fidalgos é o bloco central de que fala no livro? É, é o bloco central de interesses. Fidalgos são filhos de algo, que se arrogam de privilégios que não têm. É uma certa classe política nascida do vício que é a partidocracia. Não repararam que a democracia representativa tem de ter canalizações não enferrujadas. Mas quero a regeneração, o regresso aos princípios e aos bons exemplos dessa classe política. O ambiente atual é propício a que voltem os inimigos da democracia, por isso os partidos devem regenerar- se por dentro. Há um sistema que está a tragar o regime, mas o regime tem potencialidades. Quando fala em regenerar, não está a falar de refundar o Estado ou as funções deste? Bastavam duas ou três mensagens do Presidente da República, alargando os horizontes da democra- cia, que não são a aritmética de uma maioria absoluta no Parlamento. O Presidente da República tem um papel pedagógico fundamental a desempenhar, não apenas a bomba- relógio da dissolução. Não fazia mal um Governo de inclusão nacional, para que as gerações futuras não olhem para nós e se perguntem: “Era tudo tão fácil, porque não tentaram?” Podemos esperar sair da crise? O crítico pode ter uma sociologia de esperança. Temos a mais antiga nacionalidade da Europa e Portugal soube sempre refundar- - se, na crise de 1385, na de 1640, na crise das Invasões Francesas que se prolonga até 1820, bem como na do fim do império de 1974- 75. Só agora estamos a ter consciência da descolonização – da euforia da descolonização passou- se para a bebedeira da integração europeia. E agora descobrimos que o nosso poder internacional é diminuto, com 900 anos a república dos portugueses tem pouco poder internacional. A solução da crise não é simples, tem de se evitar as megalomanias de anos recentes. Isto terá de ser tratado por uma revolução cultural, que passa pela consciência individual de cada português, que passa por um sistema educativo que recupere o indivíduo. Mas isto vai resistir. Podemos esperar que homens como Cavaco, Passos, Gaspar ou Seguro fiquem na história? Ninguém sabe quem fica na história. São fenómenos de longa duração. Como disse Tocqueville, quem faz a história é o homem, mas sem saber que história vai fazendo. O 25 de Abril não foi o que aconteceu num dia, acabou por ser aquilo que nos estruturou. Quanto a mim, o 25 de Abril vai chamar- se soarismo e cavaquismo. Os líderes provisórios deste interregno, como José Sócrates e Passos Coelho, são apenas de interregno. O próximo ator será o povo, como em 1385, quando D. João foi empurrado. O que precisamos é de mais Europa política e forças de Estado de direito universal. Um Estado pequeno como o nosso só beneficia recorrendo a instituições internacionais, como a União Europeia.