Semper Augustus
Arrancou, ontem, com as eleições na Andal uzia e as eleições municipais em França um ciclo eleitoral na Europa que inclui, entre outras, eleições gerais no Reino Unido e em Portugal. E no próximo domingo teremos as eleições antecipadas na Madeira e com a particularidade de os dois partidos que governam col i gados na República se apresentarem bem separados naquela região autónoma. Acredito que o tradicional mapa partidário na Europa vai sofrer um forte abalo. E não tenho dú- vidas de que grande parte da classe política em muitos países da Europa ainda não percebeu as sementes da i nstabilidade que determinam estas mudanças significantes e de que a Grécia é, tão- só, um exemplo recente e relevante. Na Andaluzia, o tradicional bipartidarismo espanhol vai ser abalado pela emergência do Podemos e dos Ciudadanos. Em França, a Frente Nacional consolida- se como um partido i mportante e os seus resultados já não serão, se bem que apenas numa primeira volta, entendidos como surpreendentes. O que percorre a
Europa é um sentimento de desigualdade. Com múltiplas e íntimas desigualdades. E aquele sentimento é um fator de instabilidade política. E de alterações partidárias. As lideranças partidárias precisam, na minha modesta opinião, tanto de economistas ou financeiros quanto de sociólogos ou de especial i stas em antropologia. E de profundo conhecimento da história. E não, apenas, dos contadores de “estórias”. É que esta democracia híbrida determina pragmatismo em relação às transformações que estão a ocorrer. E uma delas i mplica perceber que “ter uma classe média relativamente ampla é bom para a democracia”. E esta classe média, abalada entre nós, sabe, por experiência pró- pria, que o dinheiro e a política estão em processo de “divórcio”. Se olharmos para todos aqueles que estão a sair à rua desesperados pelo dinheiro perdido – no BES, e que afinal era GES – percebemos que a política, e os políticos – mesmo vestindo o fato de banqueiros nacionais ou europeus –, os quer tratar como as holandesas “tulipas”. Ou seja, como se regressássemos ao mercado de flores do sé- culo XVII. Como nos elucida Alexandre Versignassi num interessante livro – Crash –, um vírus começou a contaminar as tulipas. Mas “só atacava as plantas de vez em quando, o que tornava essa variedade um tipo raro, exclusivo. Tão exclusivo que ganhou um nome pomposo, Semper Augustus, e um preço estrondoso. Em 1624, um botão custava, em florins holandeses, o mesmo que uma casa em Amesterdão! Mas na altura, e no arranque do Estado moderno, o governo holandês “precisou de intervir”. Não por causa das “tulipas”. Mas em razão da economia e das pessoas. Por excelência, aquelas que, não sendo especuladores, sofrem. Desesperam. Pelas poupanças de uma vida!
O que percorre a Europa é um sentimento de desigualdade