Diário de Notícias

O caminho é a meta

- LINA SANTOS Jornalista

Nas 25 edições que a Meia- Maratona assinalou ontem, o mais próximo que tinha estado de cruzar a ponte a correr foi quando disse a uma amiga que não tinha interesse nenhum em participar no evento. Eram os anos 90 e desde então só pensei nesta prova para me queixar de ruas fechadas e dessa vergonha que é a Câmara Municipal de Lisboa permitir que se altere a pacatez da capital para as pessoas... correrem. Correrem! Essa parvoíce... Essa pessoa fez os seus primeiros três quilómetro­s seguidos em outubro e ontem atravessou a Ponte 25 de abril ao lado de outras 40 mil pessoas de todas as idades, de todos os pontos do país, em forma ou nem por isso, e correu 21,0975 quilómetro­s de seguida ( é preciso assinalar todos os centímetro­s), rindo- se dessa criatura que era há um ano, que reclamava sem saber o que perdia. A vista de Lisboa, desde logo. Custou? Custou muito. Quando terminei, ao fim de 2h39m, os vencedores, o britânico Mo Farah, que não chegou a demorar 60 minutos, e a queniana Rose Chelimo ( 68 minutos e uns pozinhos) já tinham recebido as suas medalhas e, provavelme­nte, já estavam no hotel a descansar. Enquanto isso, havia quem maldissess­e a sua existência ( quilómetro 10), ainda no Cais do Sodré, pensasse em desistir ( 12. º ) , prometesse nunca mais calçar os ténis ( 13. º ) , muito menos para participar em alguma coisa que tivesse remotament­e que ver com uma prova que vem da Grécia Antiga ( 15. º ) , se tentasse distrair a ver quem já estava a chegar à meta, nos Jerónimos, quando ainda lhe faltava ir ao Dafundo e voltar. O milagre é que lá para 18. º quilómetro, sabe- se lá como, a pessoa pode sentir- se fresca como se tivesse acabado de começar. Ao 19. º levanta a cabeça, alarga a passada e acha que sim, que vai ser possível terminar. Ao 20. º sabe que vai conseguir e já só pensa na meta. Ao 21. º sente que podia endireitar Portugal e fazer da Síria uma democracia. A corrida acaba e, apesar de nem se saber quanto é 2+ 2, está- se contente. Três horas depois já se pensa na próxima.

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