Diário de Notícias

O menino da fronteira que orgulha os espanhóis

Mohamem Marhoum nasceu em Marrocos, mas fugiu para Ceuta aos 9 anos, sem papéis, para conseguir uma vida melhor. Agora é uma das coqueluche­s do atletismo espanhol, depois de a falta de jeito o ter afastado do futebol

- GONÇALO LOPES

Em 2000 Mohamed Marhoum era apenas mais um menino marroquino que deixou sem papéis a fronteira do seu país natal, Marrocos, rumo a Ceuta, cidade autónoma espanhola que constitui um enclave espanhol em território marroquino, para tentar a sua sorte, então com 9 anos. Agora é um dos desportist­as que a Espanha mais idolatra, concretame­nte no atletismo.

Nascido numa família bastante humilde, Mohamed Marhoum cruzou afrontei-ra apenas acompanhad­o pelo irmão mais novo Bilal. Es - te, contudo, regressou a Marrocos e o agora atleta acabou por tornar- se aquilo que em Espanha chamam de meninos MENA ( menores estrangeir­os não acompanhad­os), ingressand­o numa antiga residência militar de Ceuta convertida em centro de acolhiment­o, o Centro Esperança.

Gostava de estudar, de trabalhar e tinha uma paixão pelo desporto em geral. Não imaginava enveredar por uma carreira no atletismo, isto até 2007, altura em que decidiu participar nas célebres corridas de São Silvestre. O seu sonho era ser futebolist­a mas um dos monitores de uma casa de acolhiment­o percebeu as suas qualidades para o atletismo. “Tive de lhe comprar uns ténis, mas dava para ver que tinha um enorme potencial para o desporto, essencialm­ente o atletismo. No futebol não era grande coisa”, disse um dos responsáve­is pelo Centro Esperança, Serafín Be - cerra, à Agência de notícias EFE, de Espanha. Foi o começo de um sonho. Venceu essa mesma prova, no final de 2007, e daí para a frente começou a ganhar também todas as provas locais com facilidade.

A Federação de Atletismo de Ceuta entendeu então que para melhorar o seu rendimento Mohamed Marhoum teria de rumar a Madrid, instalando- se em mais uma residência para os tais MENA, mas por pouco tempo. Em 2009 o treinador Fernando Seoane Pampím, um dos melhores técnicos de crosse, resolveu acolhê- lo e trabalhá- lo para se tornar um dos melhores de sempre da história da modalidade do país vizinho. Para tal, tinha de jurar a constituiç­ão espanhola, algo que fez em 2011, naturaliza­ndo- se espanhol.

Dois anos mais tarde tornou- se campeão da Europa por equipas de 10 mil metros, conquistan­do a prata no Europeu deste ano, ao que juntou depois o título espanhol de crosse pelo Guadalajar­a, também de forma coletiva. Mohamed Marhoum, contudo, sempre sonhou vencer um título individual e no início desta semana conseguiu- o, no

Diz- se espanhol mas o seu coração continua em Ceuta

campeonato de crosse de Alcobendas. O menino da fronteira, co mo também é conhecido, não esquece o seu passado. “Lutei para chegar aqui. Sou campeão por Espanha, mas o meu coração é de Ceuta e do Centro Espe- rança, onde fui criado”, disse Mohamed Marhoum, que agora já aponta aos mundiais de crosse, no próximo dia 28, na China: “Vou dar 100% para que os espanhóis fiquem orgulhosos de mim.”

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Marhoum em Alcobendas, quando venceu o título nacional

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