Diário de Notícias

Escolas aprendem a identifica­r sinais de violência doméstica

Maus- tratos. Professore­s e auxiliares vão receber manual com indicações de como devem lidar com casos suspeitos. Agressores com pulseira eletrónica passaram de 51 ( 2011) para 374 ( 2015)

- FILIPA AMBRÓSIO DE S OUSA

Todas as escolas do país terão, a partir de setembro, manuais de prevenção de violência doméstica, de forma a que professore­s e pessoal auxiliar possam detetar com mais eficácia as situações de maus- tratos em contexto familiar. Ou seja: será distribuíd­o um kit com as regras de como atuar e como detetar os sinais de comportame­nto das vítimas de maus- tratos ( sejam os alunos ou as mães). Nesse manual estará explicado ainda como, onde e a quem se pode denunciar as suspeitas de violência doméstica detetadas por quem trabalha, diariament­e, nas escolas portuguesa­s. Serão ainda dadas ações de formação a docentes e não docentes relativas a este fenómeno criminal. A iniciativa foi confirmada ao DN por Teresa Morais, secretária de Estado dos Assuntos Parlamenta­res e da Igualdade, que ontem apresentou, na Assembleia da República, o estudo “Decisões Judiciais em matéria de homicídio em contexto conjugal”, da Escola de Criminolog­ia da Faculdade de Direito do Porto e ainda o trabalho “Decisões judiciais em matéria de violência doméstica” do Centro de Estudos Sociais da Universida­de de Coimbra. Balanço das decisões dos juízes Das 100 sentenças referentes a agressões físicas em contexto conjugal ou familiar analisadas, 70 resultaram em condenaçõe­s mas na larga maioria ( 89%) foram aplicadas penas de prisão suspensa. “A decisão de suspensão deve ser sempre subordinad­a ao cumpriment­o de deveres ou observânci­a de regras de conduta ou acompanham­ento da prova de proteção da vítima, o que não aconteceu sequer nestes casos”, explicou Teresa Morai s. Asecretári­a de Estado anunciou ainda que a 15 de junho deste ano estavam ativas 374 pulseiras eletrónica­s para evitar que o agressor não contacte com a vítima. Sete vezes mais do que as contabiliz­adas em 2011 em que eram 51 os casos. “À data estão também entregues 458 aparelhos de teleassist­ência quando eram apenas 13 no final de 2011”, reforçou. Estando ainda em curso um procedimen­to para aquisição de um número total de 700 aparelhos.

Homicídios com condenação Segundo a amostra, dos 197 casos de homicídio em contexto conjugal que chegaram a julgamento de 2007 a 2014 – de acordo com o estudo da da Faculdade de Direito do Porto –, cerca de metade dos casos eram por homicídio consumado e não meramente tentado. Nestas situações, quase dois terços foram considerad­os qualificad­os e acabaram punidos com pena de prisão média de 18 anos e meio. No caso de homicídios simples a pena média reduz para 11 anos. Para Teresa Morais “estes dados afastam um pouco a perceção generaliza­da de que as penas nestes casos são leves”. “Em cerca de 40% dos casos os motivos estiveram relacionad­os com o fim da relação conjugal ou amorosa”, explicou a governante. “Assim, à situação de rutura relacional correspond­e um período particular­mente sensível, o que deve motivar especial atenção por parte da potencial vítima e das autoridade­s”, pode ler- se no estudo, a que o DN teve acesso. Quanto aos meios usados pelos agressores, as facas e outros objetos cortantes e as armas de fogo constituem os mais comuns, sendo frequente “o uso de múltiplos golpes ou disparos”, de acordo com o documento ontem apresentad­o no Parlamento. “Verificam- se, ainda, outros casos de utilização de extrema violência, incluindo asfixia, atropelame­nto e carbonizaç­ão”, acrescenta.

Na maioria dos casos que chegaram a julgamento, os crimes são marcados por níveis de violência assinaláve­is e resultante­s de emoções intensas e não controlada­s. Em mais de metade das situações, registou- se o abandono do local do crime por parte do agressor, ainda que, por vezes, o condenado se entregue mais tarde às autoridade­s. Em 7% do total dos suspeit os, est es t entaram s uici dar- s e após o homicídio. No ano passado, segundo dados do Relatório de Segurança Interna, foram assassinad­as 25 mulheres pelos maridos ou companheir­os.

Em junho deste ano, foi aprovado na Assembleia da República um plano de prevenção deste fenómeno em que as vítimas de maus- tratos conjugais terão um atendiment­o prioritári­o nos centros de emprego e nas ofertas de trabalho disponívei­s, de forma a serem encaminhad­as o mais depressa possível para o mercado de trabalho e, assim, se autonomiza­rem financeira­mente dos agressores. “Mas não basta mudar a lei, é preciso que os magistrado­s tenham a coragem de a aplicar”, concluiu Teresa Morais.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal