Uma nova bibliografia sobre a conquista de Ceuta 600 anos depois
Aproliferação de livros nesta data em que se celebram 600 anos sobre a conquista de Ceuta surpreende pois não é nem um momento contemporâneo nem muito presente na consciência dos portugueses. Além desta surpresa na aposta editorial, nota- se uma outra característica no que se tem visto e lido, que é a particularidade de historiadores de profissão, académicos habituados a exaustivas notas de rodapé, citações e remissões para fontes bibliográficas, se terem disposto a tornar fluente o seu discurso histórico a troco de uma leitura mais percetível ao leitor comum.
É o caso dos três exemplos nas colunas à direita. Inesperado é também o esforço de uma programação antecipada das editoras para conseguirem ter estes ? produtos? mesmo em cima da hora como se verificou, sem ser por acaso.
Ora se para a classe dos historiadores o desejo de voltar a fazer referências a um facto histórico que alterou o posicionamento geopolítico de Portugal no século XV e seguintes seria de grande importância esta produção em livro, mesmo que essa história com 600 anos esteja posta em pousio por parte dos portugueses contemporâneos, já entre os autores que vivem no panorama do romance histórico não teve grande importância. O que é estranho, tendo em conta que o te ma dá pano para mangas por ter feitos, coragem, heróis, protagonistas reais e ter sido uma conquista bem- sucedida.
Entre essas margens à História, no entanto, destaca- se o aparecimento de um volume que é uma mistura entre o género de viagem e de investigação histórica, aliada à recolha de relatos e de exemplos de património e ligação entre povos. Trata- se do livro de Joaquim Magalhães de Castro intitulado Costa da Memória, que procura sempre o testemunho direto para saber como ? seis séculos após a chegada a Ceuta a presença portuguesa ainda permanece viva em África?. Um bom exemplo de como se pode extrapolar um tema e fazê- lo ganhar outros contornos sempre tendo em conta o facto histórico que lhe deu razão.
O autor em causa já demonstrou noutros trabalhos anteriores a sua grande capacidade de nómada curioso e investigador. Neste livro, Cos- ta da Memória, o propósito é revisitar a região do Norte de África, ou seja o espaço geográfico entre a costa do Magrebe e da Mauritânia, de Ceuta e Dacar, com ? diversas incursões pelo interior montanhoso do Atlas e pelos espaços desérticos do Sara. Sempre em busca do património partilhado entre portugueses e marroquinos, resultante dos encontros e desencontros destes povos ao longo da uma história.? Explica Joaquim Magalhães de Castro que as relações entre Portugal e Marrocos, por exemplo, nem sempre foram conflituosas apesar de ser essa a tónica do pensamento dominante: ? de um modo geral, revestiu-- se de um misto de alianças, convivências e até miscigenações, mantendo- se bem vivas no quotidiano marroquino.? É esse o caso de quando nos descreve a cidade de Ceuta atual, onde na principal praça da localidade em vez de estar uma mesquita encontra- se a Igreja da Nossa Senhora de África, o local onde D. João I armou cavaleiros dois dos seus filhos após a rápida conquista de Ceuta em 1415. Ou o caso de Arzila onde foi encontrar vários brasões portugueses. Até o caso de a região de Chtoukane ser a Angra dos Ruivos que Zurara e outros cronistas referem como o local onde Gil Eanes e Afonso Gonçalves Baldaia desembarcaram após dobrar o cabo Bojador e encontraram traços de caravanas árabes enquanto fizeram uma grande pescaria daqueles peixes. Ou a ilha da Goreia, onde Dinis Dias deixou os seus homens esculpirem no maior dos embondeiros as armas do infante D. Henrique.
Este volume, diga- se, não pretende ser como os outros três referidos nesta página um manual de História, mas contém bastantes fragmentos de histórias que não podem deixar de ser inseridas no que se pode dizer serem parte de uma nova bibliografia sobre Ceuta 600 anos após a sua conquista.
Explica Joaquim Magalhães de Castro que as relações entre Portugal e Marrocos nem sempre foram conf lituosas