Diário de Notícias

Tour. Quando a camisola amarela é uma maldição

Froome não quis usar a camisola que Tony Martin perdeu ( devido a uma queda) mas conservou liderança. Cavendish venceu a etapa

- RUI MARQUES S I MÕES

“Où est le maillot jaune...?” podiam perguntar ontem os adeptos mais distraídos que seguissem o pelotão da Volta à França, algures no percurso ente Livarot e Fougères. Onde está o camisola amarela...? Não está. Pela 5. ª vez na história da corrida – desde que, em 1919, se passou a usar tal vestimenta –, ninguém envergou o símbolo, devido à ausência do 1. º classifica­do. Tony Martin ( EtixxQuick­step) desistiu, após ter fraturado a clavícula. E Chris Froome ( Sky), novo líder, não quis usurpar vestes que não eram dele... e que mais parecem amaldiçoad­as nesta edição do Tour.

Ontem até foi um dia tranquilo. O inglês Froome conservou o 1. º lugar sem sobressalt­os ( incidentes, só fora da estrada, com a exclusão de Luca Paolini, da Katusha, que acusou cocaína num controlo antidoping). E a Etixx- Quickstep recebeu um prémio de consolação, depois da perda da camisola amarela: o também britânico Mark Cavendish ganhou a etapa, ao sprint, batendo André Greipel ( Lotto Soudal), que já ganhara duas tiradas.

“Regressar hoje como fizemos e ganhar é fantástico. Isto também é para o Tony”, sublinhou Cavendish. Afinal, nas mentes da equipa belga ainda o mais recente capítulo da espécie de praga que afeta os maillots jaunes do Tour: já houve 15 homens a desistirem da prova quando estavam em 1. º lugar e este ano a maldição parece estar bem viva..

Na 3. ª etapa, caiu o líder Fabian Cancellara ( Trek) – vítima da aparatosa queda coletiva que também apanhou os portuguese­s Rui Costa ( Lampre) e José Mendes ( Bora- Argon 18) –, ficando em tal mau estado que terminou a tirada a 11.43 minutos do vencedor e acabou por desistir, devido a fraturas nas vértebras lombares. Aí, tecnicamen­te, não foi um abandono do camisola amarela: o suíço já a tinha perdido, ao concluir a etapa em 188. º lugar.

Tony Martin viveu uma história ainda mais inglória, ao ser obrigado a desistir quando vestia mesmo a amarela ( que andara quatro dias a perseguir). O alemão caiu anteontem, a 800 metros da meta da 6. ª etapa, ao tentar lançar o sprint de Cavendish ( acabou por vencer o colega de equipa Zdenek Stybar). Ainda acabou a etapa, de braço imobilizad­o, ajudado por colegas de equipa.

Mas ontem, enquanto era dado o tiro de partida em Livarot, já Martin estava em Hamburgo ( Alemanha), para ser operado à clavícula esquerda. “No Tour, sorte e azar andam de mãos dadas. Foi uma montanha- russa de emoções e agora acabou. Estou desolado”, afirmou.

A imagem do alemão a cortar a meta, anteontem, amparado pelos companheir­os da Etixx- Quickstep, fez lembrar outra igualmente icónica: Luís Ocaña, camisola amarela do Tour de 1971, a tentar terminar a 14. ª etapa, apoiado por colegas, depois de ter caído e fraturado a clavícula, na descida do Col de Menté. Então, o espanhol acabou por desistir. E, como ontem, o beneficiad­o – o belga Eddie Merckx ( que viria a vencer a prova) – abdicou de usar o símbolo da liderança na tirada seguinte.

Igual gesto nobre ( ou superstici­oso) tiveram o holandês Joop Zoetemelk ( 1980) e o norte- americano Greg LeMond ( 1991), depois dos abandonos, devido a problemas de saúde, do francês Bernard Hinault e do dinamarquê­s Rolf Sørensen, respetivam­ente. Da mesma forma, em 2007, o espanhol Alberto Contador preferiu não usar o maillot jaune, após 1. º classifica­do, o dinamarquê­s Michael Rasmussen, ser excluído da prova pela própria equipa – Rabobank – por suspeitas de doping.

Se o Rasmussen foi o mais insólito? Nem tanto. Entre as 15 desistênci­as de camisolas amarelas registadas na história do Tour há as do belga Sylvère Maes ( 1937) e do italiano Fiorenzo Magni( 1950) porque as suas equipas se sentiam ameaçadas pelos fanáticos adeptos franceses. E a do gaulês Victor Fontan ( 1929), porque a bicicleta se estragou e não conseguiu encontrar uma de substituiç­ão.

Quanto a Chris Froome, que hoje já vestirá de amarelo, quase sem querer, resta- lhe prestar atenção à maldição... e aos rivais: com as bonificaçõ­es, Peter Sagan ( 3. º ontem) subiu ao 2. º lugar e já está apenas a 11 segundos da liderança.

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