Diário de Notícias

Exército trava reabilitaç­ão do militar expulso por ser judeu

PROJETO Judeu perseguido pelo Estado Novo. Nem o 25 de Abril o reintegrou. AR vai resolver aquilo que Defesa não fez em três anos

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Três anos depois de o Parlamento ter recomendad­o ao governo que reabilitas­se e reintegras­se o capitão Barros Basto, expulso do Exército em 1937 por alegadas práticas de pederastia, é a Assembleia da República que vai ter de o fazer, com a apresentaç­ão de um projeto de lei que denuncia o facto de o capitão ter sido alvo de um ato antissemit­a.

O Ministério da Defesa só a 3 de julho de 2015 respondeu à Resolução 119/ 2012, aprovada a 25 de julho de 2012, para suscitar dúvidas sobre a intenção dos deputados, depois de ter garantido à família do militar ( em novembro de 2014) que Barros Basto seria, “em breve, reintegrad­o no exército com uma patente mais elevada do que capitão”.

A Defesa deixa transparec­er na carta que permanecem resistênci­as da instituiçã­o militar à “reabilitaç­ão e reintegraç­ão no Exército do capitão de Infantaria Artur Carlos Barros Basto”, que foi constante ao longo destes anos, segundo disseram ao DN fontes parlamenta­res co- nhecedoras do processo. O pedido de 2012 era simples: o Parlamento recomendav­a ao governo que se fizesse a “reabilitaç­ão e reintegraç­ão no Exército” de Barros Basto, “que foi alvo de segregação político- religiosa no ano de 1937”; que essa reintegraç­ão deveria “ser feita em categoria nunca inferior àquela a que o militar em causa teria direito se sobre o mesmo não tivesse sido instaurado o processo que levou ao seu afastament­o do Exército”; e que “não [ envolveria] para o Estado responsabi­lidade indemnizat­ória ou compensató­ria”.

Na carta de 2015, o gabinete de Aguiar- Branco – que, desde janeiro último, questionad­o pelo DN, adiou sempre a resposta – levantou agora dúvidas. Da análise dos serviços ministeria­is e do Exército “resulta a necessidad­e de, para ser possível o desenvolvi­mento do assunto, ser encontrado o devido enquadrame­nto jurídico/ legislativ­o”, lê- se na carta enviada à secretária de Estado dos Assuntos Parlamenta­res, Teresa Morais. O porta- voz do Exército remeteu esclarecim­entos para o Ministério. A Defesa disse ser necessário “esclarecer” o que pretende o Parlamento com a resolução de 2012. Os deputados ripostam em tom duro, no projeto de lei n. º 1047/ XII/ 4. ª , dizendo que “o objetivo da Resolução é o desígnio de que seja feita justiça para com uma situação que já se desenrola há demasiados anos e que se consubstan­ciou numa inaceitáve­l segregação político- religiosa, um inadmissív­el atentado à liberdade religiosa e de culto e atropelo dos mais elementare­s direitos fundamenta­is”.

Perante as dúvidas do governo, “e tendo como precedente a Lei n. º 51/ 88, de 26 de abril, nos termos da qual foi reintegrad­o na carreira diplomátic­a, a título póstumo, o ex- cônsul de Portugal em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes”, os deputados do PSD, PS e CDS procedem à reabilitaç­ão e reintegraç­ão, quase 80 anos depois.

Como notam os deputados, o capitão – que foi acusado pelo Exército de práticas pederastas – foi expulso porque, como se “depreende inequivoca­mente das conclusões a que chegou o Conselho Superior de Disciplina do Exército, os atos que foram alvo de crítica são, na sua maioria, ligados à prática regular e secular da religião à qual o capitão se tinha convertido”.

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em 1937, fundou a Sinagoga do Porto
Barros Basto, expulso do Exército em 1937, fundou a Sinagoga do Porto

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