Cavaco questiona reforço do poder das secretas
Presidente quer saber se acesso aos metadados ( localização das chamadas telefónicas, por quem e quando) é inviolável sem haver um processo- crime. É o 22. º diploma com pedido de fiscalização preventiva
O Presidente da República considera justificado o acesso das secretas aos metadados das comunicações – quem, quando e onde falou – em matéria de luta contra o terrorismo transnacional. Contudo, as dúvidas de constitucionalidade suscitadas sobre essa norma levaram- no ontem a requerer, pela 22. ª vez, a fiscalização preventiva de um diploma ao Palácio Ratton.
“Não estando em causa o mérito e a necessidade deste regime, em especial no contexto das ameaças à segurança colocadas pelo terrorismo transnacional e tendo sido, de resto, aprovado por uma expressiva maioria, superior a dois terços dos deputados em efetividade de funções, importa saber se a citada norma é conforme à Constituição”, informou Belém.
Em causa, no novo regime jurídi- co do Sistema de Informações da República, está saber- se se os metadados têm o mesmo tipo de proteção constitucional que os dados pessoais e se, além dos órgãos de investigação criminal, outros podem aceder- lhes. O diploma foi aprovado por PSD, CDS e PS, com os votos contra do PCP, BE, Os Verdes e o deputado Pedro Delgado Alves ( PS).
A Constituição diz ( art º 34 º ) que “é proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal”.
O deputado e constitucionalista Pedro Delgado Alves disse ao DN que “não se trata de discordar da questão em abstrato, mas de como está redigida”, pois “não existe um processo- crime que dê garantias a quem é intercetado” ou permita “fundamentar [ a medida] junto da autoridade que a vai autorizar”.
“Não se trata de interceder e fazer escutas, mas de saber quem, quando e onde falou” e se isso está protegido da ingerência nas comunicações, acrescentou.
O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia, ligado ao PSD, adiantou ao DN que não considera a norma inconstitucional, pois “a proteção máxima” dada pela Lei Fundamental “é para os dados pessoais” e não para os metadados.
De qualquer forma, observou o académico, “o Presidente fez bem” em recorrer ao Tribunal Constitucional “para não permitir a entrada em vigor de uma lei” como esta quando há dúvidas sobre a sua constitucionalidade.
“O PCP desde o primeiro momento colocou a questão da inconstitucionalidade e fomos acompanhados pelos pareceres do Conselho Superior do Ministério Público e também pela Comissão Nacional da Proteção de Dados”, disse o dirigente Francisco Pereira.
Para o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, “esta era uma violação grosseira da Constituição no que toca aos direitos fundamentais das pessoas, porque dava total liberdade, sem qualquer suspeita, para os serviços de informações irem procurar e vasculhar a vida privada de cada um”. Além de “uma derrota do governo”, o pedido de Cavaco também o é para o PS, que “se colocou ao lado daqueles que procuram afrontar o Tribunal Constitucional e os direitos fundamentais dos cidadãos”.