Diário de Notícias

Trump como Perot: ao serviço dos Clinton

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Donald Trump faz lembrar Ross Perot e não é por serem ambos bilionário­s da lista da Forbes. E ninguém melhor do que o casal Clinton para notar a semelhança e deliciar- se. É que ao deixar no ar, durante o debate televisivo entre os candidatos às primárias republican­as, que avançará como independen­te se não for a escolha do partido, o magnata do imobiliári­o arriscase a imitar o destino do texano que em 1992 ofereceu a Casa Branca a Bill Clinton. Agora seria Trump a abrir portas para Hillary.

É verdade que Trump pode estar apenas a chantagear o eleitorado republican­o, ou a dar cabo dos nervos dos rivais no partido, mas com uma fortuna avaliada em quatro mil milhões de dólares ( ele diz ter o dobro) tudo lhe é possível. Até montar uma máquina de campanha que o leve ao colo até 8 de novembro de 2016, quando teria de enfrentar o candidato democrata, quase de certeza Hillary, e também a aposta oficial republican­a, provavelme­nte um dos nove homens que com ele debateram na Fox News.

Em 1992, esse modelo de corrida a três revelou- se desastroso para o campo conservado­r. Perot até terá seduzido algum eleitorado de centro, mas os 19% de votos vieram sobretudo de gente que no cenário clássico apoiaria o candidato republican­o. O resultado foi o presidente em funções, George Bush, perder dez milhões de votos em relação a 1988 e o democrata Bill Clinton chegar à Casa Branca com 43% da votação popular. Desde 1968 e a primeira vitória de Richard Nixon que nenhum presidente era eleito com menos de metade dos sufrágios.

Trump também se recordará bem desse efeito Perot. Na época dedicava- se sobretudo a fazer crescer a fortuna pessoal, mas tinha já um olho na política: chegara a pensar candidatar- se em 1988. Mas, em vez de aprender a lição, é tão megalómano que é capaz de acreditar que fará melhor do que o milionário texano. E que tendo, ao contrário de Perot, começado por tentar a nomeação republican­a, seria na hora H capaz de unir a direita.

Nesse caso, Trump faria mesmo história. O sistema eleitoral americano favorece o bipartidar­ismo até ao exagero, mais ainda quando se trata da escolha do inquilino da Casa Branca. O voto popular serve para definir um colégio de grandes eleitores e isso prejudica os independen­tes, vítimas do chamado voto útil. Perot serve aqui de exemplo: com 19% dos votos não ganhou em nenhum dos 50 estados e elegeu zero grandes eleitores; já os 43% de Clinton garantiram- lhe 370, e os 38% de Bush 168.

Recuando até ao início do século XX, além de Perot só em 1912, 1924, 1948 e 1968 houve terceiros candidatos fortes. E, destes, o resultado mais substancia­l foi o de Theodore Roosevelt, com 27% dos votos. Mas chamar a Roosevelt independen­te é abusivo: como republican­o cumpriu dois mandatos presidenci­ais e só regressou em 1912 porque não gostou da governação de William Taft, o sucessor. Aliás, Roosevelt tentou ser a escolha oficial do partido e foi após falhar que avançou sozinho. Ofereceu de bandeja a vitória ao democrata Woodrow Wilson, eleito com 42%, menos do que Bill Clinton.

Ora, se hoje os Clinton estão entusiasma­dos com a ameaça de Trump, outra dinastia política andará angustiada. Jeb Bush, cuja capacidade de angariar dinheiro de campanha só tem rival em Hillary, sempre foi o favorito na área republican­a. Agora, mesmo que confirme a vantagem teórica, pode ver Trump ultrapassá- lo pela direita na reta final. E a ajudar um Clinton a derrotar uma vez mais um Bush. Não seria politicame­nte correto, claro, mas no debate na Fox News Trump disse que esse era uma conceito que desprezava.

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