Verão com Eça e o Egito, Camilo com Pombal e Pigafetta no Congo
Osenhor Camilo Castelo Branco inscreve logo no prefácio que “este livro não pode agradar a ninguém”. Refere- se, claro, aos da sua época: “Nem aos absolutistas, nem aos republicanos, nem aos temperados.”
Já Eça de Queiroz não está preocupado com o público leitor, muito pelo contrário, diverte- se a relatar a sua odisseia para ir assistir à inauguração do canal do Suez. Talvez porque era muito jovem e quisesse dar vazão ao seu estilo. Ou beber em terras santas cenários para enredos de romances antibeatice.
Por seu lado, o navegador português Duarte Lopes faz questão de relatar as suas viagens ao italiano Filippo Pigafetta, que no ano longínquo de 1591 as reúne em livro para contar ao mundo as novidades relacionadas com as navegações seiscentistas.
Pode dizer- se que este é o resumo de três livros que a Alêtheia Editores lança mesmo no início deste agosto, ainda a tempo de quem vai ou está de férias ter a hipótese de consultar uns volumes que o tempo passado já declarou como clássicos. Que não são de leitura empedernida ou fúteis, antes bastante interessantes e que nem sempre se encontram disponíveis nas nossas livrarias.
Se não é o caso do primeiro, é- o nas outras duas situações, a de Camilo e de Pigafetta.
No que respeita ao volume em que Eça de Queiroz conta a sua aventura oriental, O Egito – Notas de Viagem, o pretexto era o novíssimo canal de Suez. Que lhe permite, e ao futuro cunhado, conhecer o Cairo e Jerusalém. Uma viagem que logo teve eco no Diário de Notícias e que marca definitivamente o escritor ainda muito jovem – 23 anos. Para quem conhece a obra queirosiana não pode deixar de notar as influências em personagens futuras, como Teodorico no romance A Relíquia, talvez o mais inspirado por esta aventura. Ou Fradique Mendes, Carlos da Maia e até João da Ega, cujo interesse pelo Oriente está sempre presente. Ou em obras como O Mandarim e em artigos compilados nas Notas Contemporâneas, Cartas de Inglaterra e Crónicas de Londres. Recorde- se que Eça parte para o Egito a 23 de outubro de 1869 e só regressa a Lisboa em 3 de janeiro do ano seguinte, somando setenta e dois dias por aquelas terras e muitas histórias.
No que respeita ao volume de Camilo Castelo Branco, Perfil do Marquês de Pombal, é título que anda desaparecido das livrarias. Em que o próprio autor se considera em péssima situação, pois “a substância da obra” está sujeita a controvérsia mesmo que bata com a “História aos argumentadores”. Para Camilo esta é uma tentativa “de desfazer com livros as persuasões que se fizeram em locais de jornais baratos” e, mesmo que não acredite no poder de alterar a perceção sobre o Marquês, considera estar na hora de substituir a “tolice por ideias novas”.
No terceiro livro, Relação do Reino do Congo e das Terras Circunvizinhas, também pouco visto em livrarias, em que estamos perante a recolha de um depoimento de Duarte Lopes, de quem se desconhece quase tudo, pelo matemático Pigafetta, que assim desvenda uma história dos descobrimentos tão ignorada.
Se não fosse o matemático Filippo Pigafetta, pouco se saberia do navegador português Duarte Lopes