Diário de Notícias

Desemprega­dos dos cartazes do PS trabalham na Junta de Arroios

Histórias não são das pessoas que aparecem. O PS já pediu desculpa. Novos cartazes com a cara de Costa colocados hoje

- RUI PE DRO A NTUNES com JOÃO PEDRO HENRIQUES

Primeiro um certo ar religioso, depois o destaque de um emprego perdido durante um governo PS e ontem a descoberta de que os últimos cartazes da campanha são falsos. Os outdoors que a campanha de António Costa pôs na rua sobre o emprego contam histórias que não acontecera­m com as pessoas que neles aparecem. Isso mesmo f oi confirmado ontem por uma das caras dos cartazes, que está a ponderar processar o PS.

Ontem à noite, o partido pediu desculpas públicas. E decidiu voltar às origens. Hoje chegam novos cartazes às ruas e mais simples não poderiam ser: a cara de António Costa e a frase “É tempo de confiança”.

“Estou desemprega­da desde 2012, para o governo não existo.” Era esta a frase associada à cara de Maria João Pinto num dos cartazes espalhados pelas ruas. Como contou ao Observador, a história não é sua, a “afirmação é falsa”. Maria João – que trabalha na Junta de Freguesia de Arroios – disse estar “revoltadís­sima” e revelou que já falou com uma advogada. A alegada desemprega­da não só tem emprego como foi no local de trabalho que foi abordada para tirar a fotografia. Maria João diz que foi chamada no dia 30 de julho ao gabinete da presidente da junta de freguesia ( a ex- presidente da Abraço, Margarida Martins) e que esta lhe pediu para tirar uma “foto para a campanha de António Costa”. O pedido surpreende­u- a, mas acabou por assentir quando apareceu um fotógrafo.

Contudo, segundo contou ao Observador – o DN tentou contactar Maria João Pinto através do Facebook, mas não obteve resposta, apesar de a mensagem ter sido lida –, pensou que haveria um processo a seguir e nunca que a sua foto fosse espalhada pelas ruas com uma “frase falsa” e sem o seu consentime­nto.

Ontem, em nota oficial, o PS pe- diu “desculpas públicas, em especial às pessoas implicadas”. Os socialista­s referem que “terá havido um entendimen­to, por parte das pessoas envolvidas, diferente do que havia sido determinad­o”. No mesmo comunicado, o partido revela que “solicitou já esclarecim­entos pormenoriz­ados aos fornecedor­es e prestadore­s de serviços, bem como todas as informaçõe­s necessária­s para que se possa avaliar o procedimen­to seguido”.

Acontece que o caso de Maria João não é único. A “falsa desemprega­da” denunciou dois outros semelhante­s. Um deles de um rapaz ( que o DN não conseguiu contactar) que no cartaz aparece como alguém que f oi f orçado a emigrar em 2012, mas que afinal vive em Lisboa e também trabal ha na Junta de Freguesia de Arroios. Como acontece com a senhora que surge no cartaz que havia alimentado a polémica da véspera: desemprega­da desde o tempo do anterior governo social i sta e “há cinco anos sem qualquer subsídio ou apoio”. Na verdade, a cara desse outdoor não só trabalha ( também na Junta de Freguesia de Arroios), como, segundo conta, está a fazê- lo ao abrigo de um programa do Centro de Emprego. Ou seja: um apoio no âmbito das políticas de emprego.

Na quarta- feira, quando as redes sociais começaram a explorar o facto de um cartaz do PS pôr em causa a governação de Sócrates, os socialista­s defenderam- se dizendo que se tratava de “histórias reais” e que a análise negativa à campanha só podia estar a acontecer por falta de hábito relativame­nte à “veracidade” e “honestidad­e” dos cartazes.

O DN tentou contactar o diretor de campanha do PS, Ascenso Simões, e a presidente da Junta de Freguesia de Arroios, Margarida Martins. Mas nenhum deles respondeu aos inúmeros contactos, incluindo mensagens por escrito. Durante o dia de ontem o DN tentou, junto do PS, obter os contactos das pessoas envolvidas na campanha, para contar as suas histórias, mas também não obteve resposta.

Edson não participou no cartaz E se Edson Athayde ficou em maus lençóis devido aos cartazes que remetiam para a imagética religiosa, o publicitár­io já nada teve a ver com esta campanha do desemprego. A informação foi confirmada ao DN por fonte da campanha do PS ontem durante a tarde, que explicou ainda que os cartazes divulgados na quinta- feira vão apenas ser distribuíd­os em “cinco pontos” e “não por todo o país”, pois trata- se de uma “campanha temática”. Os cartazes estão incluídos na bandeira de Costa de que o combate ao desemprego é a “causa das causas”. À noite, com o pedido de desculpas, o PS informava que os outdoors iriam ser retirados.

Seguristas arrasam estratégia “Tanto disparate.” “Trapalhada.” “Tempo de erradicar a incompetên­cia.” Foram estas algumas das expressões utilizadas por ex- dirigentes seguristas que criticaram ontem a estratégia seguida pela campanha de António Costa. E se os cartazes acenderam o rastilho, a notícia de que o apoio do PS a Sampaio da Nóvoa está tremido fez explodir as críticas seguristas.

António Galamba – membro do Secretaria­do Nacional no tempo de Seguro – utilizou a sua página do Facebook para alertar que é “preciso parar esta sucessão de disparates” da direção socialista.

Galamba não poupou o líder do PS a críticas, afirmando que “para quem se apresentou como valor seguro para conquistar uma maioria absoluta para o PS, quase com um estalar de dedos, está tudo a ser feito para a obtenção de um resultado no sentido oposto”.

O ex- dirigente socialista ainda endureceu o tom, pedindo a cabeça de quem demonstra inabilidad­e política. “Vai sendo tempo de erradicar a incompetên­cia, a falta de visão política e a incapacida­de para gerar a confiança necessária. Se é para prosseguir este tipo de iniciativa­s, mais vale não fazer nada”, referiu, numa alusão aos cartazes do emprego.

Em várias i ndiretas de que a mudança no PS foi para pior, Galamba escreveu que a atual estratégia “não mobiliza, faz ruído e não capitaliza (...) o descontent­amento com o governo PSD- CDS”, lembrando que o PS tem de seguir caminho do “ciclo de vitórias iniciado nas autárquica­s e continuado nas europeias”.

Na mesma rede social, o também antigo homem de confiança de Seguro, Miguel Laranjeiro, não quer acreditar no artigo do Público que refere que “há na direção socialista quem sublinhe que o PS pode passar bem sem apoiar nenhum candidato e até ver eleger um presidente que não seja de esquerda”. Laranjeiro recorda a frase e acrescenta: “What?! Não apoiar um candidato de esquerda? Assistir a um candidato de direita passear até à vitória?”

O também segurista José Junqueiro – no seu blogue pessoal – optou por destacar a sondagem do Expresso que dá o PS à frente, mas com a coligação a apenas 1,5% nas intenções de voto ( 36,3% do PS, contra 34,8% de PSD), com os socialista­s a descer 0,4 pontos percentuai­s e a coligação a subir 0,2. José Junqueiro escreve que “a confiança transmite- se, não se proclama [ numa alusão aos cartazes tempo de confiança]. Esse é o maior desafio do PS e de Costa. As atitudes mais recentes dividiram o PS e não ajudaram muito, como se vê”.

José Junqueiro complement­a que “a trapalhada dos cartazes e da campanha também não [ ajudaram]. O equívoco no apoio a Sampaio da Nóvoa muito menos”. O ex- dirigente socialista questiona: “O país precisa que o PS ganhe as eleições, mas, assim, como confiar?”

PS pede “desculpas públicas” e solicitou “esclarecim­entos pormenoriz­ados”

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Em cima, cartaz com rosto de Maria João, elaborado sem consentime­nto.
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