Diário de Notícias

A peregrinaç­ão tradiciona­l que reflete a nova emigração

No Santuário, naquela que é a sua peregrinaç­ão anual e que reúne milhares de fiéis, os emigrantes pagam as promessas feitas e muitos fazem outras para arranjar emprego

- ALEXANDRA SERÔDIO

Chegam com ramos de flores, velas de vários tamanhos e alguns bonecos de cera nas mãos. Os óculos escuros tapam as lágrimas de emoção de quem deixou o país em busca de uma vida melhor. No Santuário de Fátima, os emigrantes “recarregam baterias” para enfrentar o próximo ano de trabalho, numa peregrinaç­ão, ontem e hoje, que reflete cada vez mais a nova vaga de emigração portuguesa.

Luís António, licenciado em desporto e com 29 anos, saiu de Paredes ( Porto) há quase um ano. Sem trabalho, rumou a França “onde já tinha alguns contactos”, na tentativa de “poder trabalhar e começar uma vida”. Os sonhos, admite, têm sido adiados e na zona de Paris, onde vive com amigos, vai fazendo “uns biscates” que “mal dão para as despesas”. “Acredito que vou conseguir qualquer coisa melhor e por isso não vou voltar para Portugal. Nem que seja a varrer ruas ou outra coisa qualquer, é preferível tentar em França que aqui”, assume. Para além das promessas, relacionad­as com saúde, Luís António admite que veio “pedir a Nossa Senhora ajuda para arranjar um trabalho”. Ludovina, a mãe, não consegue conter as lágrimas enquanto ouve a conversa do filho. Aos 59 anos e com dois filhos emigrados, esta viúva mostra- se compreensi­va com as escolhas. “Eles têm direito a procurar uma vida melhor que aqui não há”, afirma.

Ricardo e Sónia Cordeiro estão em França há mais de 20 anos e regressam a Portugal apenas de dois em dois anos e não abdicam de participar na peregrinaç­ão dos emigrantes. Naturais de Paredes de Coura, e com “a vida feita” em Paris, o casal diz não pensar em regressar. Falam das “muitas dificuldad­es que muitos portuguese­s estão a passar” quando chegam a França. “Aquilo já não é como há 10 ou 20 anos…. Há menos emprego.”

Sebastião, filho de emigrantes portuguese­s e já nascido em França, fala também dos desafios que os novos emigrantes têm de ultrapassa­r, garantindo que naquele país “já não há muito trabalho para todos e esse tem sido o problema. Há muitos a passar dificuldad­es”.

Há sete anos no Mónaco, Marco, de 28 anos, trabalha como pedreiro. Levou a mulher consigo e, como arranjou emprego, já aumentou a família. Naturais de Guimarães, dizem que “agora tudo está a correr bem” e que pela cabeça não passa a hipótese de regressar. “Estamos bem, com trabalho e saúde”, assume Marco, frisando a “necessidad­e” de “vir a Fátima para agradecer e, este ano, fazer uma promessa”.

A meio da t arde de ontem, o bispo da Diocese de Leiria Fátima f alou, durante a conferênci­a de imprensa que antecede a Peregrinaç­ão Internacio­nal do Migrant e, do “drama dos refugiados”, que “se está a tornar uma tragédia oferecida pelos órgãos e Comunicaçã­o Social”, e acusa a Europa e as “estâncias internacio­nais” de “indiferenç­a”.

“Há países mais pobres, como a Jordânia e o Curdistão, com menos recursos, mas que têm um coração maior e mais acolhedor do que a Europa, que está num egoísmo crescente”, afirmou D. António Marto, assegurand­o que o drama dos refugiados na Itália, Grécia e Calais ( França) “brada aos céus”, reclamando “a urgente solidaried­ade, e que seja eficaz” da Europa e das Nações Unidas.

“São seres humanos, com histórias e famílias e a Europa, nomeadamen­te, não pode ficar indiferent­e a esta tragédia humana. O bispo admitiu ainda, e tal como aconteceu em 1974 com o regresso dos refugiados do Ultramar, que a Igreja Católica possa vir a abrir seminários e mosteiros para receber os refugiados da Síria.

O bispo falou ainda do “extermínio” dos cristãos no Médio Oriente, pelo autoprocla­mado Estado Islâmico, e pediu aos peregrinos de Fátima orações. Lembrou ainda os bombeiros que combatem o flagelo dos incêndios e manifestou “o apoio afetivo e de oração”.

Bispo admitiu abrir mosteiros e seminários para receber refugiados da Síria

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Geração mais nova também participa na peregrinaç­ão

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