“Se for preso, vou com o Carlos Abreu Amorim”
Utilizar sigla de partidos da coligação para os “prejudicar ou injuriar” é crime. Mas será que a norma se aplica aos “falsos cartazes”?
LEI “Aquele que, durante a campanha eleitoral, utilizar a denominação, a sigla ou o símbolo de partido ou coligação com o intuito de o prejudicar ou injuriar será punido com prisão até um ano e multa de 1000$ a 5000$.” É o que diz o artigo 130. º da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, e, à primeira vista, aquilo que se passa no Twitter há algumas semanas, e nomeadamente na conta de Luís Vargas, parece preencher este tipo criminal. Confrontado com o facto, este espanta- se: “Não fazia ideia de que podia ser crime.”
Podia ser, mas, de acordo com o porta- voz da Comissão Nacional de Eleições, João Almeida, não é provável que a lei se aplique no caso de Vargas, ou de qualquer dos outros autores de “cartazes” que se multiplicaram no Twitter mal apareceu o primeiro outdoor, “evangélico”, do PS. “Sobre se estamos em campanha, estamos, não contam só os 15 dias antes das eleições”, diz o representante da CNE. “Mas estou na comissão há mais de 12 anos e nunca nos chegou uma queixa sobre isto. E não é provável que se considere utilização abusiva uma mera paródia ou chacota.” Aliás, lembra, o Tribunal Constitucional já tornou claro que permite grande latitude na sátira política, ao considerar a imagem de Jardim com bigode à Hitler, num tempo de antena da oposição madeirense, como dentro dos limites da liberdade de expressão.
Domingos Soares Farinho, jurista membro da CNE, considera que, para além de “a maioria das pessoas achar engraçado e não ter noção de que usar os símbolos pode ser crime, se perdeu completamente o controlo, até já há um ‘ gerador de cartazes’”. E, frisa, “a norma foi criada para proteger de situações ostensivas evidentes e para garantir que a luta política é justa. Pelo que para os pressupostos do crime estarem preenchidos teria de ser um caso ostensivo de apropriação da simbologia para prejudicar um partido para benefício de outro. Ora é muito complicado distinguir o que é o uso do símbolo dentro dos limites da liberdade de expressão e fora deles. Nestes casos um tribunal teria grande dificuldade em distinguir entre sarcasmo e caricatura e ofensa ou menorização”.
Luís Vargas tem a mesma convicção: “Concordo com leis que impeçam o estilo de campanha negra que existe nos EUA, em que se abusa da simbologia de outros partidos. Mas a liberdade de expressão nas redes sociais é algo que se deve prezar ( dentro de determinados limites, como é óbvio), e sinceramente não acho que a utilização de símbolos visuais seja mais preocupante do que certas coisas que são ditas só em texto.” Em todo o caso, acrescenta: “Se for preso por fazer isto, o deputado Abreu Amorim [ que postou há poucos dias no Twitter um cartaz com o símbolo do PS e a imagem de Sócrates, satirizando a situação do ex- PM] também tem de ser.” Dá uma gargalhada: “Se partilharmos a mesma cela, espero que seja maior do que as do Aljube.”
O tweet de Abreu Amorim é, curiosamente, posterior a declarações da PAF à SIC a propósito das criações de Vargas, nas quais se mostra muito desagradada –“repudiamos este tipo de ações na internet, condenamos a utilização dos símbolos de forma despudorada” – e garante ter dado “orientações expressas para não haver campanhas sujas. A campanha deve ter elevação e não cair abaixo do aceitável”.
Ao DN, que tentou saber se a PAF tenciona apresentar queixa contra Vargas ou outros, o diretor de campanha, José Matos Rosa, recusou qualquer comentário, escusando- se igualmente a apreciar a forma como Abreu Amorim acolheu as “orientações”. Já a direção da campanha do PS, a primeira a ser alvo na “guerra dos cartazes”, afirmou à SIC, ainda pela voz do entretanto demitido Ascenso Simões, que vê a coisa “com bom espírito”: “Mostra que a imaginação foi transportada para as redes sociais e isso dá outra alegria às campanhas, que não têm de ser tristes e sorumbáticas.”