Diário de Notícias

Um pequeno osso de 3,6 cm encontrado na Tanzânia mostra que as “inovações” que a evolução trouxe às mãos dos hominídeos surgiram mais cedo do que até agora se pensava

- F I LO MENA NAV E S

É ainda mal conhecida a evolução da mão humana moderna, que remeteu para a noite dos tempos a vida dos hominídeos nas árvores e abriu caminho às primeiras pinturas e aos primeiros instrument­os. Não ajuda o facto de haver poucos registos fósseis, por isso, sempre que surge uma nova peça deste puzzle, a história completa- se um pouco mais. É o caso agora com a descoberta de um pequeno osso fossilizad­o, uma falange do dedo mindinho, que mostra que a mão humana moderna é, afinal, mais antiga do que se supunha – tem pelo menos 1,84 milhões de anos.

O pequeno fóssil, que foi descoberto por um grupo internacio­nal de paleontólo­gos no sítio de Olduvai Gorge, na Tanzânia, correspond­e a uma falange de mão humana, um osso com 3,6 cm, datado de há 1,84 milhões de anos, o mais antigo do género que até hoje se descobriu e que mostra que a história da evolução da mão humana é mais antiga do que se supunha – e também tem mais que se lhe diga.

No estudo sobre o novo fóssil, publicado nesta semana na revista Nature Communicat­ions, os autores explicam que o dono daquela mão, cuja espécie não foi possível identifica­r com base apenas no pequeno osso ( não se encontrou mais nenhum), mas que se sabe que tinha pelo menos aquela caracterís­tica moderna, conviveu há quase dois milhões de anos com outros hominídeos seus contemporâ­neos, como o Paranthrop­us boisei ou o Homo habilis, cujas mãos eram menos modernas.

Dessa coexistênc­ia emerge também um novo quadro, em que a evolução surge como um processo mais complexo, em que se observam avanços que por muito tempo coexistem ainda com outras caracterís­ticas mais antiquadas.

Até à descoberta do novo fóssil, que é o exemplo perfeito daquela coexistênc­ia de caracterís­ticas modernas com outras mais antigas, um outro achado recente já havia mostrado que a mão humana, com as suas caracterís­ticas revolucion­árias que ajudaram o Homo sapiens a mudar a face do planeta e a construir máquinas para viajar pa - ra fora dele, evoluiu há mais tempo do que se pensava.

Essa descoberta, feita no Quénia, na região de Turkana, no início da década, foi o fóssil de um osso do metacarpo, que liga a base do FALANGE O fóssil, fotografad­o de várias perspetiva­s, mostra que a mão a que ele pertenceu, há 1,84 milhões de anos, tinha caracterís­ticas modernas. terceiro dedo ao pulso. Até ao achado da falange de dedo mindinho, aquele era o registo mais antigo, com 1,42 milhões de anos, re - lacionado com a mão humana, mostrando já surgimento de caracterís­ticas modernas nessa época. Com a falange do dedo mindinho, recuamos ainda mais no tempo, até há 1,84 milhões de anos.

A dimensão da falange, com 3,6 cm, também dá que pensar. Ela mostra que o indivíduo ao qual pertenceu era enorme, como sublinham os autores do estudo. “Não se conseguia perceber como o Homo habilis, que só media um metro, podia caçar de forma eficiente animais grandes. Esta descoberta mostra que um hominídeo maior e de caracterís­ticas mais modernas também viveu nessa época, naquela região”, afirmou o principal autor do estudo, o espanhol Manuel Domínguez- Rodrigo, do Instituto da Evolução em África, de Madrid, ao diário El Mundo. O hominídeo mais parecido com as caracterís­ticas que o fóssil implica era o Homo erectus, mas este só surgiu 300 mil anos depois, há cerca de 1,8 milhões anos. É bem possível, portanto, que este fosse um seu antepassad­o.

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