A gestão, a gestão!
Orelatório preliminar do Banif, produzido pela inevitável comissão de inquérito parlamentar, transformou-se no mais previsível e caduco fruto da Assembleia da República: luta partidária, ajuste de contas entre o atual e o anterior governo (e vice-versa), e lá muito ao fundo a análise do que aconteceu de errado neste pequeno banco transformado em sugador de dinheiro público. Talvez fosse de esperar que, chegados aqui, com o país vulnerável e com os nervos de todos à flor da pele, os partidos conseguissem estar à altura das circunstâncias e deixassem para segundo plano a compreensível, embora pueril, inclinação para o foguetório partidário. Os motivos que levaram à queda do Banif podem ser analisados em três momentos. No primeiro, deveriam ficar expostos os clamorosos erros de gestão – ou talvez mais do que isso – que permitiram até 2012 a concessão de crédito sem controlo de risco ou com a administração do banco a ignorar os avisos para não aprovar esses empréstimos volumosos. O segundo momento deveria centrar-se na gestão política (BdP e governo) do processo a partir de 2012, deixando para o fim – terceiro momento – os tenebrosos seis meses finais do Banif, uma mistura explosiva de paralisia, opacidade e irresponsabilidade coletiva. Apesar de ser relevante que se investigue o período a partir de 2012, a importância do que ficou para trás não pode passar entre os pingos da chuva apenas porque os partidos querem ajustar contas uns com os outros. O banco fundado por Horácio Roque é o exemplo perfeito de uma instituição financeira que nunca deveria ter existido naqueles termos: faltava-lhe a base de capital mínima, não tinha sequer a capacidade de gestão adequada. O Banif nunca foi genericamente um banco, foi uma bolha especulativa, o resultado da loucura a que se convencionou chamar “alavancagem” financeira e que originou excesso de liquidez mundial. Há um mês o Banco de Portugal considerou negligentes uma série de banqueiros ligados ao BES e houve quem respirasse de alívio: pelo menos não era dolo. Qualquer profissional acusado de negligência – um médico, por exemplo – teria a carreira arrumada. Na banca, uma arma de destruição intrusiva e massiva, o grau de tolerância é laço, esponjoso, ridiculamente permissível. As coisas parecem estar a mudar, parecem, mas para que a página mude de facto os exemplos como o do Banif têm de ser esquadrinhados de fio a pavio. Os políticos têm responsabilidades neste caso, sim, mas a gestão privada e o regulador são quem deve sentar-se no banco dos réus.