Carlos Martins e Solidade estreiam jazz crioulo
O novo projeto do saxofonista português e da cantora cabo-verdiana deu início ao último dia do Músicas no Mundo em Porto Covo
É sabido que um dos fatores mais importantes na música é a cumplicidade entre os seus executantes. “Não se explica, simplesmente existe e quando assim é apenas há que deixar fluir”, diz ao DN a cantora cabo-verdiana Jenifer Solidade, horas antes de subir ao palco para apresentar pela primeira em Portugal o projeto conjunto com o quarteto do saxofonista português Carlos Martins.
Conheceram-se no ano passado, durante uma jam session no Krioul Jazz Fest, na Cidade da Praia, em Cabo Verde, que nessa noite juntou em palco músicos cabo-verdianos, americanos, cubanos, brasileiros e portugueses. “Logo ali houve uma enorme empatia, tanto musical como pessoal e, por coincidência, quando apresentei o meu primeiro disco, Um Click,o Carlos estava em Cabo Verde e voltámos a falar na possibilidade de fazer algo juntos”, recorda Jenifer.
No início deste ano, começaram finalmente a pensar nos temas e a trabalhar nos arranjos, que seria pela primeira vez apresentado ao vivo no palco principal da última edição do Kriol Jazz Fest, em abril deste ano. Do repertório do grupo, que, além de Carlos Martins e Jenifer Solidade, inclui ainda o guitarrista Mário Delgado, o contrabaixista Carlos Barretto, o baterista Alexandre Frazão e o pianista cabo-verdiano Khaly Angel, fazem parte temas de autores como Mário Lúcio ou José Afonso, bem como o inédito No Teu Coração, composto em conjunto por todos nos ensaios. Além do português, há também canções no dialeto angolano kimbundu e, claro, muito crioulo, embalado pelas sonoridades deste jazz com morabeza, perfeito para o fim de tarde quente e soalheiro que se avizinha.
Apesar de ser assumidamente uma cantora de morna, Jenifer Soledade não é uma estranha ao jazz, até porque o seu trabalho em nome próprio é também ele uma fusão de vários estilos. “Sempre gostei de jazz e por isso está a ser uma experiência fantástica. Não foi difícil, porque apesar de ser uma forma diferente de cantar, esta também é a minha forma de cantar”, garante. Foi precisamente a sua voz que de imediato cativou Carlos Martins, na tal jam session em Cabo Verde. “Deu para ver, logo de imediato, que a Jenifer tinha um potencial enorme. É uma mulher inspiradíssima e inspiradora, que canta de forma magnífica, com a sua voz mais grave”, sublinha o saxofonista, para quem a cantora é no entanto muito mais do que isso. “Não é apenas uma simples vocalista, é um grande músico que não só compõe connosco como participa em todos os arranjos.”
À medida que se aproxima o final da tarde e enquanto o primeiro concerto não começa, há espetáculos espontâneos de malabarismo ou de música. Para muitos, é tempo de dar um pulo até ao mercado de artesanato, onde por esta hora começam a chegar muitos dos artesãos que se espalham pelo passeio, junto aos stands maiores. Nos pequenos mostruários, encostados às árvores, encontram-se exotismos como as biojoias em ouro vegetal, feitas com um capim de brilho metálico e dourado que cresce em certas regiões da Amazónia. Um pouco mais afastado, sobre a relva, o italiano Gianni, com as suas longas rastas pelas costas, garante que tudo o que vende é “feito apenas com as mãos e energias positivas”. Um dos produtos a despertar maior curiosidade são as mandalas em macramé, feitas a meias com a mulher.