Ministro das Finanças italiano nega risco sistémico na banca
As declarações do ministro das Finanças italiano têm o objetivo de sossegar os mercados mas contrariam o último outlook do FMI que alertava para o ciclone romano. Pier Carlo Padoan também põe de lado um bail-in
● Pier Carlo Padoan disse no final do encontro dos ministros das Finanças e governadores dos bancos centrais dos países do G20 que a banca italiana está “a ir na direção certa”.
“Estamos a ir na direção certa.” A frase de Pier Carlo Padoan, ministro das Finanças italiano, soa ao que diria o comandante do Titanic mesmo antes de ver o icebergue. Com uma diferença, o icebergue italiano é bem visível e está avaliado: 360 mil milhões de crédito malparado, um terço dos empréstimos de cobrança duvidosa da zona euro. Para se ter uma imagem mais real, equivale a dois PIB português.
Por isso, da frase atirada no final do encontro do G20 na China, a que se seguiu uma outra igualmente inesperada – “Não há nenhum risco sistémico nos bancos italianos”– percebe-se imediatamente o motivo: tranquilizar os mercados, que olham cada vez com mais desconfiança para o que se passa em Itália e, mais concretamente, com a sua banca. Aliás, no último outlook, o FMI fez questão de salientar que o sistema bancário europeu, “em particular a banca italiana e a portuguesa”, representa um risco global que se tornou “mais saliente” nos últimos tempos.
Apesar disso, Padoan garantiu aos restantes ministros da Finanças e banqueiros centrais das 19 maiores economias do mundo, mais UE, que a banca italiana não está a braços com um problema sistémico. Ao mesmo tempo, Padoan aproveitou para pôr de lado a hipótese de um bail-in de investidores privados. Ao contrário de um bail-out (casos da Grécia, de Portugal e da Islândia), em que investidores externos injetam dinheiro para tapar uma dívida, num bail-in o resgate é feito com a ajuda de depositantes, acionistas e outros credores, que suportam parte das perdas. A diretiva europeia para reestruturação e resolução de entidades não permite o resgate com dinheiro público.
Os 360 mil milhões em risco de incumprimento representam cerca de um quinto da economia italiana. Por isso mesmo, Matteo Renzi, primeiro-ministro italiano, tem estado a tentar resolver parte do problema com um resgate de 40 a 50 mil milhões que limpe os bancos, que perderam mais de metade do seu valor desde abril e continuaram a acumular perdas desde o brexit. O mais antigo banco do mundo, o Monte dei Paschi di Siena, poderá precisar de até seis mil milhões de euros, enquanto no UniCredit o valor poderá ascender aos dez mil milhões de euros. Sobre o malpa- rado, Mario Draghi defendeu na sexta-feira passada a necessidade de a Europa ter um fundo “público” para ajudar os bancos a livrarem-se dos empréstimos de cobrança duvidosa. Itália e Portugal estariam na linha da frente para beneficiar de um mecanismo deste género.
O governador do Banco Central Europeu – que argumentou que o malparado é “um problema significativo para a rendibilidade futura dos bancos e para a sua capacidade em emprestar”– acredita que o problema terá de ser resolvido com a ajuda de um fundo europeu, de capitais “públicos”, que entrará em ação quando tudo o resto falhar. “Possivelmente, precisaremos de uma rede pública para quando, em circunstâncias excecionais, o mercado de empréstimos em incumprimento não estiver a funcionar bem.”
Claro que para seguir em frente esta ideia teria de passar pelo crivo da Comissão Europeia e da Direção-Geral da Concorrência, como Draghi tratou de explicar. E se essa instituição ficasse com os empréstimos de difícil cobrança, os bancos estariam menos pressionados a encontrar dinheiro para aumentarem o seu capital.
Problema acrescido: a diretiva europeia para reestruturação e resolução de entidades que não permite resgate com dinheiro do Estado. Para poder acionar as regras de ajudas estatais, em vez da diretiva, as entidades devem ser solventes. Nem de propósito, na próxima sexta-feira a Autoridade Bancária Europeia e o Mecanismo Único de Supervisão apresentaram os resultados dos testes de stress. A partir dessa avaliação, saber-se-á quem está solvente e quem tem saúde (capital suficiente) para resistir a crises económicas e financeiras.