Digam não!
No outro dia encontrei-me, ocasionalmente, com o CEO de uma grande empresa e insisti, ainda que com pouca expectativa, no pedido de entrevista. A resposta foi, orgulhosamente: “Eu nunca dou entrevistas”. Ainda rebati, porque considero importante que o presidente de uma empresa de uma certa dimensão, comunique, ele próprio, com os seus stakeholders e com o público em geral. Os media são o palco habitual. Poucos minutos depois, calhou que um dos assessores desta mesma empresa me convidasse para almoçar. Um convite descomprometido e usual entre jornalistas e fontes de informação. O responsável pela comunicação de uma empresa é uma potencial fonte e, portanto, é importante que, pelo menos, saibam da existência um do outro. A resposta poderia ter sido outra, mas fiz questão de dizer, em frente ao tal CEO: “Nunca aceito convites para almoçar.” Acaba por ser verdade, pela falta de tempo e pela implicância com o ritual demorado destes almoços, supostamente, de trabalho. O almoço até poderá existir, poderei ser eu a devolver o convite, mas, como disse, a resposta, naquela situação, não poderia ser outra. Porque, pensei eu, naqueles instantes talvez tenha conseguido fazer entender ao CEO que as empresas e os jornalistas são parceiros, profissionalmente falando, e que, tal como um presidente pode optar por não se expor, o jornalista também tem o direito de recusar o pouco que muitas vezes lhe querem dar. Pode ter sido apenas um acesso meu de mau feitio; muito provavelmente aquele CEO queria apenas dizer que, na sua opinião, a empresa pode comunicar por outras vias, dispensando a entrevista; mas naquele momento, como noutros, com CEO e não só, existiu a necessidade de afirmar que no negócio da informação existe negociação e que fontes de informação – empresas, políticos, o que for – e os jornalistas são partes fundamentais desse processo. Ambas. Um não pode mesmo merecer um não e, por vezes, um simples não, seco, logo para começar, é indispensável nesta relação. Uma relação que nunca deve ultrapassar o nível certo de intimidade, de entrevistas e de almoços. É a excessiva intimidade que traz vulnerabilidade, dependência e fragilidade. Os convites e os presentes das empresas são comuns. Grandes e pequenos. Ainda coro quando penso nas luxuosas viagens que eu e outros jornalistas fizemos a convite de um certo banco, em que o interesse jornalístico foi, em alguns casos, desajustado. Estes presentes, a cortesia e os convites da Galp aos secretários de Estado para assistirem, em Paris, a jogos do Euro 2016 têm um único objetivo: amaciar os sentidos, criar intimidade com os convidados, até ao ponto em que o não seja cada vez mais difícil. Não é, aliás, verdade que o importante não é sempre o que mais custa ouvir e, por isso, dizer? Um bom não, assertivo e confiante, é hoje, cada vez mais, uma ciência. Mas ainda há muitos que não pensam assim.