Republicanos mobilizam ex-agente da CIA para travar Donald Trump
Estados Unidos. Candidato praticamente desconhecido pode comprometer hipóteses de vitória do candidato oficial. Mais de 50 elementos das elites do partido expressaram publicamente intenção de não apoiarem multimilionário
Como bom agente especial, mobilizado para uma operação planeada para obter resultados específicos e ainda que, aparente ou realmente não tenha qualquer possibilidade de sucesso, um pouco à semelhança de Jack Bauer na série 24, Evan McMullin está desde segunda-feira à noite no terreno para um fim específico: “salvar” os Estados Unidos de uma presidência de Donald Trump.
Ainda que o resultado final da intervenção na campanha para as presidenciais de novembro deste ex-agente da CIA – e que foi até ao anúncio da sua possível candidatura à Casa Branca diretor da entidade do partido republicano responsável pela elaboração das suas orienta- ções políticas – venha a ser a eleição da candidata do partido democrático, Hillary Clinton.
Invocando que “nunca é tarde para fazer o que deve ser feito”, McMullin, de 40 anos, anunciou uma candidatura independente à Casa Branca através de um comunicado e de mensagens no Twitter. Para este natural do estado de Utah e praticante mórmon, “Donald Trump está a apelar aos piores medos dos americanos numa época em que necessitamos de união, não de estarmos divididos”, referindo-se aqui ao partido a que pertence. Reconhecendo o facto de que os “republicanos estão a ficar profundamente divididos por um homem que está prestes a obter a posição mais poderosa no mundo, e que muitos veem, com razão, como uma ameaça para a República”.
Agente da CIA durante mais de uma década, gestor de carteira de investimentos no Goldman Sachs durante três anos, McMullin integrou em 2013 a direção do partido republicano. É um dado adquirido que este natural da terceira maior cidade de Utah, Provo, não tem a mínima hipótese de chegar à Casa Branca; nem sequer poderá apresentar-se em todos os estados, pois em alguns deles já passaram os prazos-limites para a formalização de candidaturas. O que McMullin conseguirá fazer é, a 90 dias da eleição de 8 de novembro, conseguir candidatar-se em alguns dos estados que seriam decisivos para uma vitória de Trump. A começar pelo Utah, onde um arqui-inimigo do multimilionário, o senador Ted Cruz, ganhou as primárias republicanas de forma perentória – 69% contra 14% para Trump – e onde uma importante componente da sua população, ligada às comunidades mórmones, recusa apoiar Trump.
McMullin reconheceu que só avançou por “não ter aparecido ninguém com projeção nacional” e por terem falhado tentativas de um setor importante dos republicanos, os neoconservadores agrupados em torno da Weekly Standard, particularmente ativo durante os dois mandatos de GeorgeW. Bush, ainda que a sua influência seja anterior e vá muito além da presidência deste.
Abrir caminho a Hillary Clinton No caso do Utah, McMullin tem até 15 de agosto para reunir mil assinaturas para validar a candidatura. Os media americanos recordavam ontem que desde 1964 nenhum candidato democrata ganhou o estado. A presença do antigo agente secreto poderia dividir o eleitorado republicano – pelas razões antes referidas – e abrir caminho ao sucesso de Hillary Clinton.
Se o antigo responsável republicano conseguir materializar a candidatura em mais estados, principalmente aqueles de voto oscilante (os swing states, que votam ora republicanos ora democratas), estará sempre, mesmo que por margens mínimas, as hipóteses de vitória de Trump e a favorecer a democrata. O editor de política da PBS (televisão pública nos EUA), Daniel Bush, escrevia ontem no site da estação que se o empresário do imobiliário “perder num ou dois estados de voto tradicional nos republicanos, o caminho para a presidência está comprometido”. E McMullin terá cumprido a sua missão.
No campo republicano continua a agitação anti-Trump. A longa lista de personalidades que declararam publicamente a oposição à candidatura do magnata do imobiliário foi ontem ampliada com a tomada de posição da principal senadora do Maine, Susan Collins, que, num texto no TheWashington Post, considerou Trump “inadequado” para o cargo de presidente. E, em mais um desenvolvimento claro de que boa parte das elites do partido recusa a ideia de, mesmo só de forma tácita, apoiar, para todos os efeitos, o candidato oficial do partido, 50 antigos detentores de cargo na área da segurança nacional, desde a presidência de Richard Nixon à de George W. Bush, publicaram no The NewYork Times um texto martelando a ideia de que Trump “não tem a personalidade, os valores ou a experiência para ser presidente” dos EUA.