Incêndios, blá-blá-blá
Até custa usar a palavra, de tão gasta que está, mas não há outra: prevenção. Já a ouviu conjugar com a de incêndio aí um trilião de vezes. Pois, todos opinam sobre a matéria quando o país está a arder: é o calor; são as florestas que não são limpas; é a desertificação; é a negligência dos rurais que fazem queimadas quando não devem; é a reflorestação, de eucaliptos e pinheiros, que está errada; sobreiros é que é para travar o fogo; são as mãos criminosas ou de loucos pirómanos ou ainda de quem lucra com o cheiro a queimado. Falam especialistas e leigos, sobretudo os que vivem na cidade e pouco se confrontam com esta tragédia, a não ser através do atropelo de imagens nas televisões.
Os governantes começam a evitá-la porque, na verdade a invocam em vão. É uma espécie de “ai meu Deus”, sem qualquer efeito prático. Ontem, hoje e amanhã, com o país a arder, há um blá-blá-blá nacional sobre o reforço dos meios para combater as chamas e sobre a bravura dos bombeiros. É o mais fácil porque todos concordamos com as duas coisas e não há vontade política de pensar a sério na prevenção e no que se pode fazer para que Portugal deixe de ser responsável por mais de 50% dos incêndios nos países da bacia do Mediterrâneo – ou seja, mais do que a França, Espanha e a Grécia juntas – como bem lembrou esta semana João Miguel Tavares, a partir de um estudo da União Europeia entre 2000 e 2013. Nos anos em que houve menos chão, telhados e árvores ardidas foi apenas porque o São Pedro se lembrou de nos ensopar os campos.
A incompetência, está bom de ver, não é só deste governo, ou até é ainda pouco deste governo. Mas é bom não esquecer que António Costa também foi ministro da Administração Interna, entre 2005 e 2007, e o relambório foi o mesmo sem que se tenha trilhado um caminho para debelar o cancro, que consome recursos naturais, os bens de muita gente e vidas. Mil deslocados e quatro mortos na Madeira só esta terça-feira.
Sou uma leiga, mas sempre senti calafrios quando ouvia as sirenes a chamar os bombeiros para os grandes incêndios na serra de Sintra. E como doía ver as labaredas a consumirem as encostas. Era miúda e já na altura não percebia porque se repetia aquele espetáculo deprimente e fazia perguntas, muitas perguntas. Infelizmente continuam a ser as mesmas, um pouco mais elaboradas: não é possível mudar a política florestal? E o ordenamento do território? Porque não se volta a criar a guarda das florestas? E os postos de vigia? E já agora que tal usar a nova tecnologia, os drones, para uma vigilância mais eficaz? Porque não se legisla para punir severamente quem não limpa os terrenos? E que tal investigar mesmo a sério as causas e quem é que lucra com os incêndios? É caro montar todo um sistema? Sai muito mais caro andar, ano após ano, neste desespero.