Diário de Notícias

De 1650.º do mundo até à presença no Rio. Pedro ganhou a guerra

Em 2013, após um acidente, nem sequer conseguia segurar a raquete. Mas o sonho olímpico de Pedro Martins prevaleceu

- PEDRO SEQUEIRA enviado ao Rio de Janeiro

A presença de Pedro Martins nos Jogos Olímpicos, para competir no torneio individual de badminton, é muito mais do que uma façanha desportiva. É uma história de superação daquelas que se podem apresentar de exemplo a qualquer desportist­a.

Em 2013, menos de um ano depois de participar nos Jogos Olímpicos de Londres (17.º lugar), o jovem algarvio sofreu um acidente de viação que lhe afetou o sistema nervoso, ao ponto de não conseguir sequer segurar a raquete. Forçado a parar, esteve um ano sem competir. Perdeu todos os pontos e chegou a estar classifica­do como 1650.º do mundo, em maio de 2014.

Para se apurar para os Jogos Olímpicos precisava de subir aos 60/70 primeiros da tabela. E aqui está ele. Pedro Martins estreia-se sábado, frente ao canadiano Martin Giuffre (75.º do mundo). Na última atualizaçã­o do ranking, o português está colocado em 59.º, apenas sete posições abaixo do melhor posto que já teve na carreira.

Pedro Martins ainda tem dificuldad­es em recordar o dia em que a sua vida mudou de forma drástica. No regresso de uma prova de orientação, integrada no curso de Educação Física e Desporto que fez no ISMAT, a viatura onde seguia o jogador de badminton saiu da estrada e embateu violentame­nte contra uma árvore.

“Foi tudo muito rápido. Íamos atrás de outros jipes, num terreno florestal, que levantaram muita poeira. Perdemos a visibilida­de por instantes e quando percebemos estávamos prestes a bater numa sinalizaçã­o. A reação foi corrigir o rumo e acabámos por sair de estrada, por um terreno muito íngreme”, conta ao DN, parando algumas vezes durante a descrição que vai fazendo.

Pedro Martins ia junto ao condutor e o embate foi do seu lado. Os primeiros exames que fez, no próprio dia, nada acusaram. Mas, com o passar dos dias, vieram as dores. Primeiro na zona do pescoço e nas costas. Depois na não direita, aquela com que joga. “Sentia uma grande tensão na zona da cervical e com o passar do tempo sempre que agarrava alguma coisa tinha dores. Tentava fazer força e não conseguia. O problema foi avançando e também me apanhou a mão esquerda.”

Veio o diagnóstic­o: uma compressão medular na zona cervical, que lhe tinha danificado os nervos. A fase seguinte foram os tratamento­s, sempre por conta do jogador do Che Lagoense. Mas, de início, nada resultava. “Comecei a fazer várias coisas, desde fisioterap­ia, mesoterapi­a... Foi complicado porque não sentia uma evolução. Passado cerca de um ano iniciei outro tipo de tratamento, desta vez à base de medicação, e foi só então que consegui recuperar.” Começar do zero Com a parte clínica encaminhad­a – ainda hoje tem de fazer vigilância médica –, Pedro Martins queria voltar à competição, já com o Rio 2016 em mente. Regressou em abril de 2014, muito, mesmo muito, longe dos lugares que davam acesso aos Jogos. “Comecei do zero a qualificaç­ão. Cheguei a estar em 52.º do mundo, com 25 mil pontos. Mas ao fim de um ano os torneios perdem validade e, como eu estive muito tempo sem jogar, perdi a pontuação. Depois, quando regressei à competição, por não ter ranking, jogava sempre contra os cabeças-de-série, o1, o 2... Queria progredir, mas estava a ser muito difícil.”

O desafio era enorme, mas Pedro Martins, de 26 anos, garante ao DN que sempre acreditou que ia chegar aos Jogos do Rio de Janeiro: “Muita gente duvidava, mas também existiam os que acreditava­m e me diziam: ‘Vais conseguir, vais conseguir.’ Foi muito importante. Eu também sabia que ia chegar lá, mas houve ali uma fase em que era tudo muito frustrante.”

Aos poucos, os resultados foram aparecendo, mas foram os desempenho­s “nos dois/três meses antes do Rio” que se mostraram decisivos”, com destaque para a vitória na Taça Internacio­nal do Brasil, disputada em março, em São Paulo, que lhe abriu a porta dos Jogos – em 2016, leva 36 encontros disputados, tendo vencido 27.

Agora, quer que a sua história ajude outros, principalm­ente os mais jovens. “O meu objetivo é motivá-los e fazê-los acreditar que tudo é possível. Acho que é um dever”, diz o jogador, ao mesmo tempo que espera ser colocado no próximo ano letivo de modo a iniciar a sua atividade de professor de Educação Física.

O atleta algarvio, que começou a jogar badminton aos 6 anos por influência do pai, também ele um ex-praticante desta modalidade, diz que chega aqui ao Rio 2016 mais maduro e acredita que isso pode fazer a diferença num patamar em que “todos os jogadores são muito bons física e tecnicamen­te e o que conta mais é a força mental”.

Pedro Martins não faz por menos. Depois dos sacrifício­s por que passou nos últimos anos, estar no Rio reforçou a sua confiança: “Quero o ouro mais do que tudo. Acredite.”

“Quero o ouro mais do que tudo”, refere

o algarvio

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Pedro Martins sobreviveu a acidente de jipe e a uma lesão cervical

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