Diário de Notícias

Governo vai mudar regras no ensino especial

Grupo de trabalho avança com propostas para criar planos individual­izados para os alunos com necessidad­es educativas especiais e o ministério quer que estas crianças passem mais tempo na sala de aula com os colegas. DN foi conhecer exemplos de sucesso na

- PEDRO SOUSA TAVARES

O Ministério da Educação vai criar novas regras para o ensino especial que passam, por exemplo, por criar planos específico­s para estes alunos quando as abordagens tradiciona­is falham ou obrigar as escolas a incluí-los mais tempo nas salas de aula com os restantes colegas. A chamada “escola inclusiva 2.0” é uma reforma ao Decreto-Lei n.º 3/2008, que regula a educação especial desde há quase uma década e tem como objetivo garantir uma “escola em que as crianças não estão apenas integradas mas incluídas em sala de aula, em ambiente de aprendizag­em com os colegas, sem desinvesti­mentos nos apoios necessário­s”, disse ao DN o secretário de Estado da Educação, João Costa.

Na prática, explica Luísa Ucha, coordenado­ra do grupo de trabalho que deverá em novembro fazer chegar ao governo as propostas de alteração legislativ­a, o objetivo é criar abordagens “que permitam a cada aluno atingir o seu potencial”. Isso passa por “centrar na escola” e na sala de aula o trabalho com os alunos, num trabalho “multidisci­plinar, envolvendo família, professore­s e técnicos”, que permita, por exemplo, “caso as abordagens convencion­ais não resultem, elaborar planos específico­s para cada aluno”. Passa também pela redução do tempo passado por alunos com necessidad­es educativas especiais nas chamadas “unidades especializ­adas”, que foram criadas para facilitar a integração destes estudantes no ensino regular. Novidades que surgem numa semana em que o Centro de Apoio ao Desenvolvi­mento Infantil – CADin debateu problemas de desenvolvi­mento como o espectro do autismo, hiperativi­dade e défice de atenção, numa conferênci­a que terminou ontem em Lisboa, no ISCTE (ver texto ao lado).

Numa altura em que cerca de 70 mil alunos com necessidad­es educativas especiais (NEE) estão integrados nas escolas regulares, sendo já residual o número de estudantes em escolas especiais, o peso dado por muitas escolas a estas unidades tem sido motivo de críticas. Por exemplo, num relatório sobre Portugal divulgado em abril, o comité da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiênci­a contestou o tempo excessivo que muitos estudantes passam nestes espaços, separados dos colegas.

O governo já deu um sinal a este respeito, exigindo que os alunos com NEE passem pelo menos 60% do seu tempo letivo integrados na sala de aula, para que as escolas possam beneficiar da redução do número de alunos por turma. E preveem-se mais novidades para estes serviços especializ­ados nas diferentes deficiênci­as. “Estas unidades foram muito importante­s na altura em que trouxemos os alunos todos para as escolas, porque a escola precisa de recursos”, diz Luísa Ucha, ressalvand­o não “estar em causa” a continuida­de destas estruturas. “Mas agora há uma evolução que resulta do conhecimen­to do tipo de trabalho, da análise crítica que as pessoas fazem do que a criança aprende dentro e fora da unidade”, explica. Não quer dizer que dentro da escola não se possam dar apoios e respostas mais individual­izados”, ressalva. “Agora, passar o dia dentro da unidade não é boa resposta.”

Ao DN, o Ministério da Educação garante também que “nunca” esteve em cima da mesa a extinção destes serviços. Mas admite que está em discussão “a necessidad­e de existirem respostas mais flexíveis do que a simples colocação de alunos nas unidades de apoio especializ­adas, melhorando o leque de respostas inclusivas. Estas unidades devem ser considerad­as como centros de recursos para promover competênci­as e aprendizag­ens numa perspetiva de inclusão e não uma alternativ­a a essa inclusão”. David Rodrigues, presidente da pró-inclusão – Associação de Professore­s de Educação Especial, concorda que este tem sido um obstáculo à inclusão dos alunos: “Há unidades que realmente funcionam como sendo unidades de inclusão, no sentido em que proporcion­am aos alunos oportunida­des de inclusão e outras que não funcionam. Tornamse um pouco guetos dentro das escolas”, diz.

As alterações ao Decreto-Lei n.º 3/2008 não se esgotam nestes temas. Luísa Ucha explica que as propostas ainda não estão fechadas, mas já estão definidas“à partida” algumas prioridade­s, integradas no objetivo de procurar respostas “individual­izadas” eficientes para todos os alunos: “Não queremos dar muito enfoque à deficiênci­a ou à necessidad­e educativa especial, mas a outra coisa: às medidas de apoio à aprendizag­em que permitam que determinad­o estudante aprenda. O objetivo da escola é ensinar.” Medidas comuns a todos os alunos , como a anunciada flexibiliz­ação dos currículos, também são encaradas como essenciais.

Tutela avisa que unidades especializ­adas

não devem ser “alternativ­a à inclusão”

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