ENTREVISTA A ENRIQUE ROJAS “A FELICIDADE CONSISTE EM TER BOA SAÚDE E MÁ MEMÓRIA”
Qual a diferença entre a ansiedade normal e a que já é uma doença? A ansiedade normal é inclusivamente positiva. Diz-se muitas vezes este jovem tem muitas inquietudes, interessam-lhe muitas coisas, gosta de estudar, ler, tem curiosidade por aprender. Isso é positivo. A ansiedade é negativa quando impede de levar uma vida saudável. Quantos tipos de ansiedade existem? Existem três tipos: a exógena, a endógena e as crises de ansiedade. A ansiedade endógena é onde se move o pânico, o medo de perder o controlo de si mesmo e aí aparecem taquicardias, contração gástrica, dificuldades de respirar, sensações de falta de ar. A ansiedade exógena é a que vem de fora e que se deve a um ritmo trepidante de vida, pessoas que vivem sem tempo para nada, é o stress. Em terceiro lugar estão as crises de pânico, que se tornaram moda e são episódios de ansiedade muitos rápidos, que duram uns minutos. Pode dizer-se que a sociedade e todo o stress é que causam a ansiedade mais patológica? Claro. O stress é uma vida com excessiva atividade, não há tempo para mais nada do que trabalhar. Costumo dizer que o primeiro fator anti-stress é aprender a dizer que não a tantos pedidos. Depois, ser ordenado, não querer abarcar demasiadas coisas. A ordem é sossegadora, saber o que está em primeiro e em segundo lugar. É muito importante ter uma ordem mental. Encontra muitos pacientes que não têm essa hierarquia de prioridades? As três doenças mais importantes que sabemos existir na União Europeia em psiquiatria são: as doenças depressivas, em segundo lugar os estados de ansiedade e, em terceiro lugar, agora começamos a ver muitas pessoas com transtornos de personalidade, que são desajustes na forma de ser. Acaba de aparecer a quarta patologia em psiquiatria que são as crises conjugais. Esta ansiedade vem de procurarmos sempre mais? A sociedade mudou muitíssimo de forma positiva. A Europa teve grandes avanços em todos os sentidos e ao mesmo tempo a sociedade está muito perdida. Perdida de quê? Do fundamental, que são três perguntas: quem sou? Para onde vou? Com quem? As pessoas não sabem quem são, para onde vão e as relações são muitas vezes superficiais. Como é que se pode lidar no dia-a-dia com a ansiedade? Ter muita ordem. E tem de ser ordem na cabeça, saber o que quero, quem não sabe isso não pode ser feliz; ordem na hierarquia de valores, o que é primeiro na minha vida, o que é segundo; ordem na minha casa, na minha roupa, nos meus livros. Para ser feliz é necessário conter as ambições excessivas. A ordem é um ansiolítico, produz harmonia, equilíbrio, serenidade, sossego. Outro fator é a vontade, que a psicologia americana define como a capacidade para adiar as recompensas. Se tens vontade os teus sonhos serão realidade. E vale para tudo: para melhorar a personalidade, a vida profissional, a relação com os outros, a vida afetiva. Logo, se a vontade funciona é outro grande ansiolítico. A ordem, a vontade, a disciplina. A medicação é sempre o caminho para a cura? É que em Portugal 35% da população toma ansiolíticos. Bem o melhor ansiolítico para a ansiedade externa é aprender a dizer que não. Dizer que não a exigências ou pedidos excessivos. Outro ansiolítico natural é a ordem. A ordem é um dos melhores › Psiquiatra. › Autor de livros como
(2012) ou (2015). › Lançou agora em Portugal › Filho de um psiquiatra, Enrique Rojas seguiu os passos do pai. É professor catedrático de Psiquiatria e Psicologia Médica e diretor do Instituto Espanhol de Investigação Psiquiátrica de Madrid. amigos da inteligência. E significa saber o que quero. Quando a ansiedade endógena é forte há que tomar medicação. Então os ansiolíticos são fundamentais. Que outras técnicas psicológicas se podem fazer? Uma muito importante é a psicoterapia, que é a arte e o ofício de ensinar a alguém a não fabricar ansiedade. Porque há muitas pessoas que fabricam ansiedade, porque são inseguras, adiantam-se ao negativo, têm um fundo pessimista. Medicam-se de mais as pessoas hoje, em vez de se tentar a psicoterapia? Sabemos que o primeiro medicamento que se vende numa farmácia na União Europeia, e em particular em Espanha, à frente dos antibióticos, dos analgésicos, são os ansiolíticos. Isso é sinal de que há muita gente com problemas psicológicos ou há muita gente que está medicada e não devia? Muita gente precisa de ansiolíticos, mas também há muitos conflitos, que não têm um arranjo preciso, que se estendem no tempo, e então segue-se uma solução farmacológica. Quando uma pessoa está inquieta, incerta, está nervosa, toma um ansiolítico. Há um excesso de ansiolíticos nesta sociedade porque todos têm pressa e os conflitos não se resolvem rapidamente. Falou na crise de relações. Como se pode salvar um casal em crise? Três conselhos para um casal com dificuldades. Primeiro: aprender a perdoar. Segundo: não sacar a lista de queixas do passado. Terceiro: evitar discussões desnecessárias. Por que é tão difícil hoje manter as relações? Primeiro, estamos numa sociedade hedonista, do prazer. Então a vida conjugal é muito sacrificada. Não há felicidade sem amor e não há amor sem sacrifício. No amor há que renunciar, ceder em território psicológico de um e de outro. Corrigir um casal que está em dificuldades precisa de tempo, mas estamos na era da fast food. Tem lançado vários livros em que dá conselhos. Não teme perder os seus clientes? Nos EUA toda a gente vai ao psiquiatra, é o médico de cabeceira, que ensina a questionar as emoções, como superar o stress, como viver a vida de forma mais positiva. Como se pode melhorar a expressão de sentimentos. Aprender a pedir perdão, o perdão é um ato de amor e a felicidade consiste em ter boa saúde e má memória.