Elza Pais: “Temos de perceber porque falha a proteção”
A deputada socialista Elza Pais escreveu um livro intitulado Homicídio Conjugal em Portugal, que resultou de uma longa investigação sua sobre a matéria. Foi uma das autoras do projeto de lei do PS que limita os direitos paternais a agressores domésticos sujeitos a medidas de afastamento de casa ou proibição de contactos com a vítima. Concluiu que o sistema falha na proteção a estas mulheres e que é preciso perceber as causas
O que é que está a falhar para Portugal continuar a ter uma média de 42 homicídios conjugais por ano? Há 15 anos que coloco essa questão. Temos vindo a combater o problema dos homicídios conjugais. Estou convencida de que se não tivéssemos as leis que temos nem a ação das forças de segurança que teríamos ainda mais homicídios destes. Temos conseguido travar o aumento mas não temos conseguido que diminuam. Sobretudo, temos de perceber por que falha o processo de proteção às vítimas logo depois de estas comunicarem às forças de segurança a violência doméstica. Está neste momento a trabalhar uma equipa que foi recentemente criada para fazer uma análise retrospetiva dos homicídios. Está a funcionar no quadro do Ministério da Administração Interna com a secretaria de Estado da Igualdade.Vão tentar perceber o que falha. Na sua perspetiva o que pode correr mal logo a seguir à apresentação de queixa da vítima? Ainda não temos uma resposta para isso mas apenas preocupações. Será que falhou na aplicação da pulseira eletrónica, porque não se encontraram meios para proteger a vítima, porque a vítima depois da queixa desvalorizou as agressões? Enfim, não sabemos. E é por isso que é preciso analisar os fatores, que podem ser vários. O que eu percebi é que havia uma falha legislativa. E qual era essa falha legislativa? A que levou a que apresentássemos um projeto de lei para a regulação urgente das responsabilidades parentais em processos de violência doméstica. As vítimas passam a sentir maior segurança porque sabem que as regras do jogo são mais claras. Queremos que o direito de visita e de guarda não prejudique a proteção nem da vítima nem das crianças. Para mim isto é absolutamente vital. Espero que esta medida legislativa resulte. O objetivo será também melhorar a articulação entre os processos penais e os cíveis? Sim, porque essa articulação existe mas precisa de ser melhorada. E para evitar casos em que a responsabilidade parental dos filhos venha a ser atribuída a um agressor... Sem dúvida. Mas além desta falha legislativa que percebi que existia pode haver outras. Fomos nós que propusemos a vigilância eletrónica aos agressores, eu era presidente para a Comissão da Cidadania e Igualdade de Género. Hoje sabemos que esta medida tem resultados. Fomos o segundo país, depois de Espanha, a adotá-la. A violência no namoro mostra homicídios nos mais jovens. O que fazer para travar esta situação? Aqui tem de se apostar na educação para a cidadania, que vai voltar aos currículos escolares.
“Percebi que havia uma falha legislativa. Queremos que o direito de visita e de guarda das crianças não prejudique a proteção da vítima”