Diário de Notícias

Rutte e mais três foi a conta que o povo holandês fez

Para uma maioria será necessário um acordo com pelo menos quatro partidos. Merkel, Hollande e Bruxelas suspiram de alívio com falhanço eleitoral do populista Wilders

- JOSÉ FIALHO GOUVEIA

Sempre sem pressas. No que diz respeito à formação de governo, os holandeses gostam de fazer as coisas com calma. Consideran­do as 26 eleições que se realizaram desde 1945, a média é de 72 dias. O recorde deu-se em 1977, quando os partidos necessitar­am de 208 dias para encontrar uma fórmula. Na última vez, em 2012, foram necessário­s quase dois meses.

O Parlamento holandês tem 150 lugares, o que faz que sejam necessário­s 76 deputados para uma maioria. Olhando para os resultados, isso significa que no mínimo será preciso um acordo a quatro. Se a lógica imperar, o CDA (democratas-cristãos) e o D66 (liberais no plano económico e progressis­tas nas questões sociais) são os parceiros prováveis do Partido Popular para a Liberdade e Democracia ( VVD), a formação de centro-direita liderada pelo atual primeiro-ministro, Mark Rutte. Os três juntos somam 71 deputados e ficam a apenas cinco da meta dos 76. Quem poderá ser o quarto passageiro? Os trabalhist­a do PvdA (9 deputados) – que até agora governavam coligados com oVVD – poderiam ser uma hipótese, mas o mais provável, depois do pior resultado da história, é que não queiram voltar a fazer parte do governo. Os Verdes do GroenLinks (14 deputados) e os conservado­res da União Cristã (cinco lugares) são outras possibilid­ades. No entanto, os primeiros estão ideologica­mente distantes do VVD e os segundos poderão entrar em choque com os progressis­tas do D66. Ainda muita água vai correr por debaixo da ponte.

O sistema holandês, tal como sucede em Portugal, permite a formação de governos minoritári­os com apoio parlamenta­r. Isso aconteceu em 1973 e em 2010 (a primeira administra­ção chefiada por Rutte). Nenhum dos executivos chegou ao fim da legislatur­a.

“Que grande celebração da democracia aquela a que assistimos hoje. Depois do brexit e das eleições nos EUA, os holandeses puseram um travão ao populismo”, regozijou-se Mark Rutte, o candidato mais votado. Na quarta-feira, quase todos saíram vencedores. Além de Rutte, também Sybrand Buma (líder dos democratas-cristãos do CDA, que conseguiu mais seis deputados), Alexander Pechtold (que viu os liberais do D66 conquistar­em mais sete lugares) e Jesse Klaver (dos verdes do GroenLinks que, com mais dez deputados, logrou a maior subida) foram para a cama na noite eleitoral com razões para sorrir.

Já Geert Wilders, o populista de extrema-direita que assustou a Europa com a pujança que durante muito tempo foi mostrando nas sondagens, teve uma noite assim-assim. Por um lado, conseguiu mais cinco parlamenta­res do que nas últimas eleições. Mas, por outro, ficou a 13 lugares de Rutte e muito aquém das expectativ­as que tinha criado. “Ganhámos deputados. Essa é a primeira vitória. Rutte ainda não se livrou de mim”, escreveu Wilders no Twitter uma hora depois de terem sido conhecidas as primeiras projeções. “O único verdadeiro perdedor, sem qualquer possibilid­ade de olhar para a votação e ver o copo meio-cheio, foi Lodewijk Asscher, líder dos trabalhist­as do PvdA, que elegeu apenas nove parlamenta­res – o pior resultado da longa história do partido.

No novo Parlamento haverá 13 partidos representa­dos. “Este nível de fragmentaç­ão não tem precedente­s”, sublinha, citado pela agência Bloomberg, Kees Aarts, professor de Ciência Política da Universida­de de Groningen. Europa suspira de alívio O ritual para a formação de governo começou ontem, com Khadija Arib, presidente da assembleia, a convocar todos os partidos do novo Parlamento para uma reunião com o objetivo de nomear o verkenner, designação em holandês para aquele que será o responsáve­l por fazer as primeiras auscultaçõ­es. Edith Schippers, ministra da Saúde cessante, foi a escolhida.

Ainda assim o processo formal de negociação só começará na próxima quinta-feira, dia 23, na primeira reunião do novo Parlamento – dois dias depois do anúncio dos resultados oficiais das eleições. Nessa altura, Schippers comunicará as conclusões a que chegou. O passo seguinte será a nomeação de um informador – espécie de negociador chefe que liderará o processo.

“Um dia bom para a democracia e um resultado muito pró-europeu.” Foi assim que Angela Merkel, a chanceler alemã, descreveu as contas do escrutínio holandês. Depois de vários meses com o populista GeertWilde­rs a liderar nas sondagens, os líderes europeus temiam uma possível vitória do PVV, um partido com um discurso islamofóbi­co e vincadamen­te anti-UE. Os receios não se confirmara­m e em Bruxelas e nas restantes principais capitais europeias suspirou-se de alívio. “Uma vitória clara contra o extremismo”, frisou o presidente francês François Hollande. “Um voto pela Europa”, sublinhou o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker.

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Geert Wilders, líder populista de extrema-direita, ficou a 13 deputados do partido do primeiro-ministro, Mark Rutte
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