Túnel para o Vaticano
OVaticano falou de “troca de opiniões”, o presidente americano de “encontro fantástico”. Como se esperava, não foi grande a química pessoal entre Francisco e Donald Trump, um político que o Papa tem criticado, seja por causa da imigração, das alterações climáticas ou da construção de um muro na fronteira com o México. Mas cada vez mais a Igreja está interessada no que se passa nos Estados Unidos, hoje o quarto país do mundo com maior número de católicos – só atrás do Brasil do México e das Filipinas e já à frente da Itália. E por isso a importância do encontro ontem em Roma.
Como a maioria dos americanos, Trump é protestante. E a sociedade americana do ponto de vista cultural continua, como nas suas origens, a ser de matriz protestante. Contudo, há 80 milhões de católicos nos Estados Unidos, minoria que cresce a ritmo mais acelerado do que o resto da população, sobretudo graças à fertilidade dos hispânicos.
Ora, os valores do catolicismo começam também a influenciar o futuro da América, basta pensar que um terço dos membros da Câmara dos Representantes são católicos e um quarto dos senadores também. Mas o mais impressionante é que cinco dos nove juízes dos Supremo Tribunal também o sejam, conta que pode subir para seis se incluirmos o juiz já nomeado por Trump, que nasceu católico mas desde que casou frequenta uma igreja protestante e não comenta qual a sua fé.
O Supremo Tribunal interpreta a Constituição, adaptando um texto do século XVIII à realidade do nosso tempo. Isso é um poder enorme e os juízes ainda por cima são vitalícios: só saem por morte ou por vontade própria de se reformarem. O que significa que temos garantida por muitos anos a tal maioria católica, com tudo o que isso possa significar.
Se pensarmos que Al Smith, candidato católico em 1928, chegou a ser acusado de querer um túnel entre a Casa Branca e o Vaticano, tal era o preconceito da maioria protestante, foi um longo caminho a ser percorrido. Mesmo assim, foi preciso esperar até 1960 para John Kennedy se tornar o primeiro presidente católico dos Estados Unidos. Também, diga-se, o único até agora, apesar de um outro católico, John Kerry, ter estado perto de vencer em 2004.
É de crer que, apesar de Trump ter obtido a maioria do voto católico (52%), seja da Igreja Católica que venham muitas das críticas àquilo que for fazendo. Críticas da igreja americana, mas também de Francisco, um sul-americano que não se deixará impressionar por um ianque.