Diário de Notícias

Número de grevistas em 2016 foi o mais baixo de sempre

Governo diz que houve mais uma greve no privado, mas trabalhado­res a aderir caíram 45%. “Dias perdidos” afundam 40%

- LUÍS REIS RIBEIRO

Em 2016, aderiram às greves 6537 trabalhado­res, menos 45% do que em 2015. É o valor mais baixo de uma série que remonta a 1986. O ano com maior adesão foi o de 1989, com 296 mil pessoas em greve.

De volta a 2016, o número de “dias perdidos”, um indicador próximo do prejuízo que as greves podem provocar na atividade normal das empresas, caiu 40%, para 11 757 dias, também o valor mais baixo da série de 30 anos. As perdas máximas acontecera­m em 1986, com 382 mil dias perdidos, mostram dados do governo compilados pela Pordata.

Os dados apurados pelo Ministério do Trabalho (Gabinete de Estratégia e Planeament­o e DireçãoGer­al do Emprego e das Relações de Trabalho) dizem que em 2016 houve mais uma greve do que no ano precedente. Total: 76.

As maiores adesões acontecera­m no setor dos transporte­s e armazenage­m (2610 trabalhado­res), no comércio (1085) e na indústria transforma­dora (1046 pessoas). “Mais de metade das greves tiveram a duração de um dia”, diz o estudo.

Mas o que explica o mínimo histórico de pessoas em greve? Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, a maior estrutura sindical do país, e António Mendonça, professor do ISEG e ex-ministro das Obras Públicas e Transporte­s, concordam que 2016 foi um ano excecional em termos de recuperaçã­o da confiança.

“O governo mudou” e “foram criadas expectativ­as junto dos trabalhado­res de que as coisas começariam a melhorar”, diz o sindicalis­ta. “A conjuntura tornou-se mais favorável, o desemprego continuou a cair, havia mais confiança”, intui o economista.

No entanto, para Arménio Carlos, as melhorias foram curtas e não houve reversão da austeridad­e da troika e do governo de direita, como se chegou a acenar na campanha eleitoral. “Frustraram as expectativ­as das pessoas” e isso está a levar a um aumento da contestaçã­o e dos pré-avisos de greve neste ano (ver entrevista). Citando “dados internos”, o líder da CGTP refere que no primeiro semestre de 2017 já foram emitidos 308 pré-avisos de greve, dos quais 238 no setor privado. Em todo o ano de 2016, foram feitos 487 pré-avisos, pelo que os referidos 308 da primeira metade deste ano acabam por ser um valor “proporcion­almente superior”: representa­m já 63% do ano precedente.

Além das expectativ­as mais favoráveis que marcaram 2016, Arménio Carlos admite que o elevado número de precários e o “assédio” das empresas aos trabalhado­res acabaram por limitar a ação por via da greve. Diz, no entanto, que isso foi algo de pontual já que “há mais contestaçã­o nas ruas, mais manifestaç­ões, mais pré-avisos de greve”.

António Mendonça, que integrou o último governo do PS (2009 a 2011) antes de Pedro Passos Coelho (PSD) assumir o poder, concorda que “a mudança de governo e o discurso mais esperanços­o e otimista do início de 2016 pode ter levado os trabalhado­res a moderar o seu descontent­amento”. “Seria preciso uma análise mais profunda das razões, olhar para dados, mas penso que o facto de o emprego ser mais precário terá tirado eficácia à ação sindical.”

Para mais, tal como noticiou recentemen­te o DN/Dinheiro Vivo, a retoma do emprego continua a ser feita muito com base em empregos precários, menos qualificad­os e mal pagos, avisou recentemen­te a Comissão Europeia.

Para o ex-governante, “a enorme destruição de emprego naqueles anos da austeridad­e pode ter acabado por prejudicar mais a força dos sindicados do que a dar-lhes mais força, reduzindo o número de sindicaliz­ados”. “Depois a retoma do mercado de trabalho fez-se muito com mais trabalho qualificad­o, no setor dos serviços, mais precário”, remata. “Sobre 2017, não conheço dados.”

Em 2016, o estudo do governo mostra ainda que não só a adesão à greve em número de pessoas foi a mais reduzida em 30 anos, pelo menos, como os resultados alcançados foram parcos. A taxa de recusa (de insucesso) das reivindica­ções foi de 85% (tinha sido 52,3% em 2015 e 50,8% em 2014). “Apenas 1,6% das reivindica­ções que levaram os trabalhado­res à greve foi totalmente aceites e 13,2% parcialmen­te aceites”, diz o documento do ministério de José Vieira da Silva.

“Os motivos de carácter salarial estiveram presentes em 50,4% do total” de reivindica­ções, “tendo sido recusados em 90,1% dos casos”.

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