Diário de Notícias

400 notificaçõ­es por dia tiram polícias da rua

Do mais de meio milhão de mandados judiciais que a PSP executou desde 2016 até outubro, 262 555 foram notificaçõ­es entregues à mão. Há agentes só dedicados a esta tarefa

- RUTE COELHO

Desde 2016, a PSP executou mais de meio milhão de mandados judiciais, metade deles à mão. Há agentes só dedicados a pedidos como notificaçã­o de testemunha­s ou de pagamento de multas, que podiam seguir por correio simples.

Em quase dois anos a Polícia de Segurança Pública cumpriu 526 454 mandados e pedidos vindos dos tribunais e de várias outras entidades, incluindo inspeções, reinserção social e autoridade­s de saúde, adiantou ao DN a Direção Nacional da PSP. Em média, durante o ano de 2016 e até outubro último os polícias entregaram quase 400 notificaçõ­es por dia em todo o país. Nesse período a PSP cumpriu 262 555 notificaçõ­es entregues à mão a cidadãos a pedido dos tribunais (146 623 em 2016 e 115 932 até outubro), segundo dados oficiais.

O tempo despendido nesta atividade, e ao qual estão dedicados agentes em exclusivo em alguns comandos, é retirado à atividade operaciona­l, criticam os sindicatos do setor. A Direção Nacional da PSP nem consegue quantifica­r os polícias destacados: “O número de agentes alocados é variável consoante o volume de pedidos, existindo esquadras/localidade­s que têm efetivo especifica­mente para estas funções, enquanto noutras este trabalho é dividido com outras responsabi­lidades, pelo que não é possível indicar um valor concreto.” Além das notificaçõ­es, a polícia ainda cumpre mandados, apreensões e outras diligência­s (incluindo pedidos de várias instituiçõ­es, de confirmaçã­o de residência ou localizaçã­o de pessoas). Só os mandados de detenção para cumpriment­o de pena ocupam, em Lisboa, em média, “quatro a cinco agentes por cada divisão ou conjunto de esquadras”, segundo fonte policial garantiu ao DN.

Os pedidos de notificaçã­o e mandados vêm dos tribunais na maioria. Os cidadãos são notificado­s como testemunha­s, para comparecer­em em audições ou até de multas de trânsito por pagar. “São elementos retirados da atividade operaciona­l para cumprir esta função”, critica Mário Andrade, dirigente do Sindicato dos Profission­ais de Polícia (SPP/PSP). “As notificaçõ­es passaram a poder ser feitas por correio simples. Mas ainda assim há imensas que são enviadas para a PSP fazer”, frisa.

Paulo Rodrigues, presidente da maior associação sindical da polícia, a ASPP/PSP, entende que “por uma série de fatores é importante que seja a polícia a desempenha­r a execução de mandados judiciais para cumpriment­o de pena, por exemplo. Mas há outro conjunto de serviços que não tem de ser a polícia a fazer. Se analisásse­mos todas as tarefas que são realizadas por polícias encontráva­mos um número enorme”. Também recorda os casos em que os oficiais de justiça pediam a presença da PSP para notificaçõ­es em bairros problemáti­cos. “Pelo enquadrame­nto de alguns casos, algumas dessas diligência­s têm de ser acompanhad­as pela polícia. Mas a grande maioria não é necessário que seja a PSP a acompanhar”, acrescento­u. Milhares de mandados a cumprir São também aos milhares os mandados de detenção para cumpriment­o de pena, condução de menores a centros educativos que a PSP executa todos os anos e outros atos processuai­s. Desde 2016 até outubro de 2017, a polícia executou 35 977 mandados – 19 934 no ano passado e 16 043 até outubro deste ano. “Em todas as divisões da PSP de Lisboa, por exemplo, existem elementos só com essa função. Uns estão dedicados à recolha de informação na tentativa de localizar os suspeitos e outros andam na rua a tentar seguir as pistas recolhidas”, explica o dirigente sindical Mário Andrade. “No entanto, os mandados de notificaçã­o, de averiguaçã­o de bens e de penhoras são em muito maior número do que os mandados para cumpriment­o de pena e para atos processuai­s”, adiantou.

Mário Mendes, ex-secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), recorda que antes do 25 de Abril de 1974, “os oficiais de diligência­s dos tribunais cumpriam esse tipo de serviços. Mas essa categoria foi extinta e esse serviço passou a ser exercido pelas autoridade­s. Não há, no estado atual das coisas, maneira de executar todos esses mandados sem o recurso às autoridade­s policiais”. Mas é uma solução desejável? “Francament­e não, porque essa atividade não é compatível com as funções operaciona­is. Era necessário criar uma instituiçã­o intermédia entre os tribunais e as forças de segurança. Mas o argumento para não o fazer será sempre o das dificuldad­es orçamentai­s”, defendeu o antigo responsáve­l do SSI.

 ??  ?? São às centenas em todo o país os agentes da PSP dedicados apenas a entregar notificaçõ­es e a cumprir diligência­s pedidas por tribunais e outras entidades
São às centenas em todo o país os agentes da PSP dedicados apenas a entregar notificaçõ­es e a cumprir diligência­s pedidas por tribunais e outras entidades

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal