Diário de Notícias

Empresas vão pagar mais 70 milhões por recibos verdes

Novas regras chegam em 2018 mas produzem efeitos só em 2019. Descontos baixam para trabalhado­res e sobem para empresas

- LUCÍLIA TIAGO

O agravament­o das taxas e a alteração dos limites a partir dos quais as empresas são chamadas a fazer descontos para a Segurança Social pelos trabalhado­res independen­tes deverá traduzir-se num acréscimo de receita de 70 milhões de euros. Esta é uma das medidas que integram a proposta de alteração do regime contributi­vo dos recibos verdes que será aprovada pelo Conselho de Ministros na próxima semana. O documento apanhou de surpresa os parceiros sociais.

A poucos dias de terminar o ano, governo e Bloco de Esquerda conseguira­m chegar a um acordo e dar conteúdo à autorizaçã­o legislativ­a inscrita no Orçamento do Estado para 2017 sobre o novo regime con- tributivo dos recibos verdes. O objetivo era alargar a proteção social dos trabalhado­res independen­tes e tornar mais equilibrad­o os descontos que estão obrigados a fazer.

No essencial, a proposta reduz a taxa contributi­va dos trabalhado­res independen­tes, estimando-se que beneficie 270 mil pessoas. Além disso, alarga a sua proteção nas baixas por doença, na assistênci­a à família, facilita o acesso ao subsídio de desemprego e cria limites ao atual esquema de isenção dos trabalhado­res por conta de outrem que também passam recibos verdes (ver caixa ao lado).

Aumenta-se ainda a taxa contributi­va das empresas que concentram mais 50% do rendimento do trabalhado­r independen­te. Atualmente, as entidades contratant­es que representa­m mais de 80% do do rendimento total do trabalhado­r a recibo verde são chamadas a fazer um desconto de 5%; no novo regime, esta taxa duplica, passando para 10%. E cria-se um patamar intercalar para as empresas responsáve­is pelos rendimento­s entre os 50% e os 80% de um trabalhado­r, ao qual se aplica uma taxa contri- butiva de 7% – que serve para financiar os subsídios de desemprego e de doença). Antes estavam isentas.

Somadas, estas duas alterações vão fazer que o universo de trabalhado­res independen­tes sobre os quais as empresas têm de fazer descontos aumente de 68 mil para 95 mil. E as empresas abrangidas deverão duplicar face às atuais 23 500. Tendo por referência a situação registada em 2016, estima-se que daqui resulte um aumento de 70 milhões de euros nas contribuiç­ões pagas pelas empresas.

O valor será inferior à quebra de receitas por via da descida das contribuiç­ões a cargo do trabalhado­r independen­te, que verá a sua taxa recuar de 29,6% para 21,4%. Além disto, os recibos verdes passarão a fazer descontos com base no rendimento que auferiram nos três meses anteriores e não, como sucede atualmente, com base no que ganharam há um ano ou mais.

“A avaliação global é que as mudanças que fizemos não terão, no curto prazo, um impacto significat­ivo na Segurança Social.” Ainda que isso dependa “muito do comportame­nto dos trabalhado­res e das entidades contratant­es”, diz o ministro Vieira da Silva.

Vasco de Mello, vice-presidente da Confederaç­ão do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), vê nestas alterações a lógica que guiou o Orçamento do Estado para 2018: alivia-se a carga fiscal dos particular­es e agrava-se a das empresas. E, sem pôr em causa a legitimida­de destes acordos políticos, acentua que a utilidade prática de ouvir os parceiros sociais se reduziu.

Para quem está ligado à gestão de recursos humanos, o fator que mais preocupa é a criação do patamar intercalar para os rendimento­s (50% a 80% ). “Percebo a lógica dos 80%, mas a dos 50% parece-me violenta”, precisa um destes gestores contactado­s pelo DN/Dinheiro Vivo, acentuando que as empresas apenas no ano seguinte são informadas de que têm um trabalhado­r que entra na definição de “economicam­ente dependente” e notificada­s para pagar.

Sérgio Monte, dirigente da UGT, vê vários pontos positivos nesta proposta, nomeadamen­te o facto de se criar um modelo que permite que os descontos dos trabalhado­res sejam feitos com base num rendimento mais próximo do real. O alargament­o da proteção nas baixas por doença (que passam a ser pagas a partir do 10.º dia e não a partir do 31.º) e melhoria do acesso ao subsídio de desemprego são também aplaudidas. No habitual comentário A Vida do Dinheiro, o economista João Duque antecipa que as limitações à isenção dos trabalhado­res por conta de outrem possa motivar “uma reação negativa”.

Cerca de 270 mil trabalhado­res independen­tes vão ser beneficiad­os com a descida da taxa de desconto para a Segurança Social

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Vieira da Silva não espera impacto financeiro significat­ivo das medidas no curto prazo

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