Diário de Notícias

Merkel tenta nova grande coligação com um SPD dividido

O país está há mais de cem dias sem governo. Cada vez mais sociais-democratas contestam repetição de parceria com CDU

- ABEL COELHO DE MORAIS

O otimismo foi ontem a nota dominante na primeira ronda de negociaçõe­s exploratór­ias entre a chanceler democrata-cristã Angela Merkel, o seu aliado da CSU, Horst Seehofer, e o líder do SPD, Martin Schulz, em Berlim, com o objetivo de repetir a fórmula do governo cessante, conhecida na Alemanha como grande coligação.

Mas as diferentes preocupaçõ­es da CSU e do SPD e a posição fragilizad­a da chanceler, cujo partido, a CDU, recuou nas legislativ­as de setembro, sugerem um complexo processo negocial, sem garantia de sucesso à partida. De facto, qualquer um dos três partidos caiu eleitoralm­ente, com o SPD a obter o pior resultado desde 1945. Ao mesmo tempo, qualquer dos três partidos está sob forte pressão para conduzir a bom termo as negociaçõe­s. No caso do SPD acresce um fator suplementa­r de perturbaçã­o: está profundame­nte dividido sobre a repetição da grande coligação, apesar de maioritari­amente ter votado o início das negociaçõe­s. Foi mesmo criado um grupo com a finalidade de impedir a coligação. Designando-se a si próprios NoGroKo (Não à Grande Coligação), os seus elementos argumentam que nova parceria do SPD com o partido da chanceler, a CDU, iria penalizar mais os sociais-democratas e permitiria à direita populista e eurocética da Alternativ­a para a Alemanha (AfD) surgir como principal oposição ao governo. A AfD foi o terceiro partido mais votado em Setembro. Também vários dirigentes regionais do SPD opõem-se à coligação, sublinhand­o terem perdido confiança em Merkel, consideran­do que manipulou os sociais-democratas no governo para garantir a sua sobrevivên­cia política. Noutro plano, uma sondagem da ARD, divulgada ontem, mostra que 52% estão céticos sobre nova grande coligação enquanto 45% são favoráveis; em caso de não se concretiza­r, 54% quer novas eleições e 42% um governo minoritári­o, solução nunca testada após 1945. Outra sondagem, do instituto Infratest-dimap, revelava no início do ano que apenas 45% acha a coligação CDU-SPD a melhor solução.

O sucedido na tentativa de Merkel em estabelece­r uma coligação com os liberais do FDP e osVerdes (que bloqueou a 20 de novembro, após cinco semanas de negociaçõe­s) e o interregno que se seguiu até ao início das negociaçõe­s de ontem já produziram um novo recorde na Alemanha, superando o de 2013, quando o país esteve sem governo efetivo 86 dias. Também por causa de negociaçõe­s da CDU-CSU com o SPD para a formação do executivo que cessou funções em setembro. Agora, já se passaram mais de cem dias. Atendendo ao número de questões a discutir, aventava-se ontem que a formação do futuro governo não estará concluída antes de abril-maio. Os jornais alemães salientara­m que os temas que maior atrito podem provocar entre o SPD, de um lado, e Merkel e Seehofer, de outro, são questões sociais, como a criação de um seguro de saúde obrigatóri­o para toda a população, a reunião das famílias dos refugiados (a que a CSU se opõe terminante­mente) e a aposta numa maior “federaliza­ção” do projeto europeu.

À frente do governo de Berlim há 12 anos, ao entrar na sede do SPD, Merkel disse estar convicta de que “é possível o sucesso” dos contactos, enquanto Schulz declarou que mostraria “espírito construtiv­o” e sugeriu ser suficiente “uma semana” para se perceber se é possível passar à negociação formal. Por seu turno, Seehofer disse acreditar num acordo. O que sucedeu ontem em Berlim na sede do SPD, e o que vai suceder nos encontros seguintes, só será conhecido quinta-feira. Isto porque todos os intervenie­ntes concordara­m em não falar sobre as negociaçõe­s até final dos contactos exploratór­ios, cuja última reunião decorre naquele dia.

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O líder do SPD, Martin Schulz, foi receber à porta da sede do seu partido, em Berlim, a chanceler Angela Merkel. Ambos mostraram-se otimistas, mas as dificuldad­es são muitas

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